Os filhos da nação

Alexandre Homem Cristo | ionline | 2014-01-27
Está na hora de os partidos se debruçarem verdadeiramente sobre o desafio da natalidade
Portugal atravessa um inverno demográfico. Os números são inequívocos e têm sido amplamente divulgados, de tal modo que é improvável que alguém (que participe do debate público e político) desconheça a situação. De facto, no contexto da União Europeia, o índice de fecundidade das mulheres portuguesas é o 5.o mais baixo, apenas acima de Letónia, Polónia, Roménia e Hungria. E, se a situação portuguesa se mantiver como está durante os próximos anos, o país perderá até 2030 cerca de um milhão de habitantes - ficando com 41 idosos para cada 100 portugueses em idade activa.
No mesmo sentido, é também improvável que alguém desconheça as eventuais consequências deste inverno demográfico para a organização do Estado e, em particular, para a sustentabilidade do Estado Social. Na educação, por exemplo, a queda do número de alunos implicará a necessidade de menos professores no sistema educativo. Na segurança social, o aumento do número de idosos significará um incremento nos custos (pensões e apoios sociais) a serem suportados pelo Estado. E, na saúde, o envelhecimento da população obrigará a mais cuidados médicos e, forçosamente, a mais despesa.
Assim, com o diagnóstico feito e as consequências conhecidas, resta-nos discutir as soluções. E, nesse aspecto que agora importa, o debate político tem sido pobre, tratando a queda demográfica como uma fatalidade e, convenientemente, como um argumento (por vezes válido, diga-se) para justificar a necessidade de cortes sectoriais. Mas, sendo certo que é essencial o ajuste imediato do Estado face ao envelhecimento da população, esse ajuste é também apenas parte da solução. A outra parte, raramente discutida, consiste em enfrentar o problema demográfico propriamente dito. Isto é, consiste em responder a duas perguntas: por que razão as mulheres portuguesas estão a ter menos filhos? E o que pode o Estado fazer para inverter essa tendência?
Um inquérito recentemente publicado (INE-FFMS, 2013) ajuda-nos a responder à primeira. Quando inquiridas acerca dos motivos para não terem filhos, 67% das mulheres aponta para os custos associados, 48% refere a dificuldade em obter emprego e 33% indica a difícil conciliação entre a vida profissional e a vida familiar. Ou seja, os obstáculos que mais afastam as mulheres da maternidade são económicos e laborais - algo que, conhecendo a realidade nacional, não é surpreendente.
Ora, se assim é, fica claro que a resposta à segunda pergunta deve começar por aí. Mas que medida concreta seria a mais adequada e eficaz? Ninguém sabe ao certo. De resto, as possibilidades são muitas e variadas, e nenhuma é garantia de sucesso. Podem--se criar melhores benefícios fiscais, atenuando os impostos significativamente a quem tem filhos. Podem-se introduzir apoios financeiros directos às mães, para ajudar na sua estabilidade económica. Ou, pode-se, ainda, exigir uma maior flexibilização horária para as mulheres, sem consequências remuneratórias, para que a maternidade não interfira negativamente na sua vida profissional.
Cada uma destas, ou de outras, soluções tem os seus custos e os seus efeitos próprios. E nenhum debate útil pode ter início sem a avaliação prévia desses custos e desses efeitos até conhecer experiências internacionais de casos semelhantes ao português. Está, pois, na hora dessa avaliação ser feita e, mais ainda, de os partidos se interessarem verdadeiramente pelo tema. O inverno demográfico que nos aflige só será uma fatalidade se continuarmos a olhar para o lado.

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