O Casamento da Nini e do Pedro
ISILDA PEGADO / VOZ DA VERDADE 11/10/2016
1 – A Nini e o Pedro casaram já lá vão mais
de 20 anos. Têm 3 filhas que nem sempre foram fáceis de criar mas são
encantadoras e são a alegria da casa. Agora estão quase criadas, e a casa fica
muito tempo “vazia”.
2 – A Nini olha para trás e parece-lhe que
precisa de “recuperar tempo”, quer fazer coisas que nunca fez até aos 48 anos.
Não sabe se será bom, mas quer…
O Pedro
não gosta de a contrariar, não a percebe, e para não haver desentendimentos
cala-se e fecha-se no seu trabalho.
Os dias
vão passando, e cada vez falam menos um com o outro. Parece que deixaram de ter
projectos em comum, razões para se ajudarem ou até, a atenção do outro para si,
que é nula.
3 – As filhas têm amigas, namorados e
interesses e, em casa, quase não falam. O Pedro muitas vezes diz: “parece que
nós só servimos para pagar e dar…” A Nini diz-lhe: “são fases, estão a
conquistar o mundo delas, que é diferente do nosso”. O Pedro responde: “eu
diria que são ingratas…”. E a conversa continua nesta troca de frases curtas,
puxando cada um para seu lado.
4 – O Pedro recorda com saudade a luta
diária que 10 anos antes tinham com o trabalho, a gestão da casa, a educação
das filhas na escola, as actividades desportivas, as festas de aniversário, as finanças
domésticas, etc., etc. “Casei-me para aquele mundo, não para isto…” – pensa.
A Nini
recorda “o prazer que me dava vesti-las, vê-las progredir na ginástica ou no
ballet…” e conclui “agora, isto não é nada, deixei de ser útil, tenho de
preencher o meu tempo de outra forma. Não é este o casamento que quero...”.
5 – Os dias vão passando nesta
agressividade centrifuga que aos dois molesta. A Nini em dois ou três sábados
faz programas com as amigas de escola que estão divorciadas. Mas o amargo
daquelas noites, no dia seguinte, é insuportável. O Pedro nem quer saber, fica
a ver “as séries” no Axn.
6 – Um dia, a Nini diz de si para si: “Ou
me divorcio, ou agarro a sério no meu casamento! O que será melhor? Divorciar é
fácil. Basta assinar papéis e ir à Conservatória. A outra solução dá muito mais
trabalho. Tenho de procurar em mim, o Pedro bom. Como faço?”. Sem ideias
luminosas, pensa: “Vou convidar os Silvas e os Alves para, no próximo sábado
virem jantar cá a casa. São tão divertidos… Vai dar trabalho! Começo por uma
ponta… Na 6.ª feira à noite vou ao supermercado, sábado de manhã alinho um doce
e a entrada e à tarde preparo…”. O Pedro inicialmente resiste ao jantar. Mas
com aquela azáfama da Nini vê que tem de tratar do vinho, de pôr a mesa e… a
certa altura diz “Maria Emília, tu não subas para esse banco que vais cair…”. –
“Maria Emília”! O nome que ele usava dantes quando a queria repreender, ou
ralhar. “Que bom! Esta protecção de marido, não há igual”.
7 – Quando no fim da noite do jantar todos
saem, ficam os dois a conversar (enquanto arrumam os pratos) sobre a Joana e o
Manuel, o filho da Teresa e do Rui… A Nini, ao deitar-se, pensa: “Já não me
lembrava do Pedro bem-disposto e alegre como hoje”. E o Pedro diz-lhe: “Temos
de repetir estes programas. Há quanto tempo não estamos com os padrinhos das
miúdas?”.
8 – No dia seguinte as filhas notam
diferença nos pais. Aquela tensão entre eles, e os monossílabos, deram lugar a
risos e cumplicidades. A Ritinha que é a filha do meio diz: «Hoje à noite eu
faço o jantar, e não admito negas. Jantamos os cinco. O menu é “Francesinhas”».
9 – “O casamento é uma roda que vale a pena
fazer rodar no sentido certo, ainda que com muito esforço, abnegação, entrega e
até lágrimas… Voltar sempre ao eu – o
que posso fazer pelo meu casamento? – Coisas simples” explica a Nini à colega
de escritório que lhe diz estar a passar por uma “má fase” com o marido.
Força
Nini e Pedro! Vale a pena.
Isilda
Pegado
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