Quer perder peso? Pergunte-me. Como McDonald"s
João Taborda da Gama
DN 2016.02.28
Isabel do Carmo escreveu nesta semana sobre impostos, sinto-me por isso à vontade para escrever sobre dietas. Então cá vai: foram dez quilos. Dez quilos, é isso mesmo. É o que diz a balança no dia dos dois meses da minha primeira dieta. Eram noventa, agora são oitenta. Qualquer dia ainda arranjo abdominais, avisou-me uma das minhas filhas. Abdominais era coisa que não existia no meu tempo: havia rabos, músculos nos braços, outras saliências e perturberâncias (sic), mas não se falava de abdominais. A culpa é do Figo e do Rui Costa que apenas se preocupavam com o cabelinho, e não perceberam que podiam ativar a marca da sua barriguinha, como fez o Ronaldo anos mais tarde. Já para não falar do Futre ou do Rui Barros, que até devem achar esta conversa meio esquisita.
Em dois meses de regime tenho aprendido muita coisa. Por exemplo, quando me meti nesta aventura não antecipei que há uma diferença entre fazer-dieta e fazer-uma-dieta, e que quem faz-dieta, como eu, é visto como um troglodita por quem faz-uma-dieta. Estás a ser acompanhado? Ao princípio julguei que era uma pergunta para despistar eu poder estar com um cancro e não estar a querer contar. Mas depois percebi que não se deve fazer dieta sem acompanhamento, e que do acompanhamento resulta uma dieta com nome, com gráficos e com suplementos. E aqui as pessoas dividem-se, umas gabam dietas-com-nome, outras a melhor-dieta-para-ti. A minha dieta não tinha nome, era a minha dieta, a dieta que eu inventei. Quando se diz a alguém que fomos nós que inventámos a nossa dieta, e que não tem nome, quebra-se um tabu. Por isso passei a dizer, é uma dieta low-carb-high-protein. E as pessoas, espertas, não acreditam. E fazem mais perguntas. E então tenho de dizer a verdade: que é uma dieta à base de McDonald"s. Uma refeição salada portuguesa, outra salada havaiana, ambas com meia dose da garrafinha de molho vinagrete do azeite Gallo. Ao lanche, cenouras bebés também do McDonald"s. Em ambas as saladas as alfaces são frescas e estaladiças, sem pontas negras ou chochas, pelo menos no meu Mac. A salada portuguesa é a melhor: tem atum, feijão-frade, ovo, cebola e salsa, 243 kcal. A havaiana tem, além da alface e de um péssimo nome, tomate, queijo e maçã.
Dez quilos, como é que conseguiste, perguntam, muitas vezes sem muito interesse na resposta. O truque é comer menos (a sério?). Para comer menos, é comer sozinho, em sítios feios. Dá fome? Dá. É fazer como as miúdas giras: água e pastilhas elásticas. Cortar álcool, doces, refrigerantes, pão, manteiga (ainda hei de escrever sobre isto). Quando se vai jantar fora, ou almoçar, aí é fazer à vontadinha e cortar a refeição seguinte. Porque isto só tem uma regra, gastar muito mais calorias do que as que se comem. Outra pergunta é se tenho feito exercício: não, porque isso dá fome (e não gosto).
Já sei, já sei, que me pode fazer mal e que não é uma perda de peso sustentada e que o peso vai voltar, e que não vou passar a vida a comer saladas do McDonald"s, que é uma estupidez, só tu para teres essas ideias e depois contares isso no artigo. Pois eu respondo: meus queridos, para ser uma dieta como as vossas, à minha só lhe falta uma coisa, só lhe falta falhar.
Relembro que comecei por avisar que não sei do que estou a falar, que só me atrevia a falar disto porque a Isabel do Carmo falou de fiscalidade, ela é que começou. O mais extraordinário é que concordo com muito do que escreveu sobre impostos, onde não concordo tanto é mesmo na parte das dietas, e na ligação que faz entre obesidade, neoliberalismo e as virtudes deste OE. Uma das teses do artigo é que o neoliberalismo engorda: ora eu só consegui emagrecer por causa do McDonald"s, esse poster-child do neoliberalismo (não há aqui nenhuma ironia: se não tivesse encontrado aquelas saladas não tinha emagrecido, ponto). No texto refere um artigo publicado nos Estados Unidos: pelos dados que transcreve presumo ser o "Can Changing Economic Factors Explain the Rise in Obesity?, de Charles J. Courtemanche e outros. Fiquei curioso e estive a ler o longo artigo (não apenas o abstract). A premissa do artigo é, basicamente, a de que a gordura tem uma relação inversa com o preço das calorias, quanto mais baixo o preço, mais bombas calóricas (no pun intended). O estudo, que é uma análise de dezenas de estudos anteriores, identifica os principais fatores que afetam a obesidade, o Índice de Massa Corporal e a obesidade classe II/III: a concentração de armazéns discount e de restaurantes numa determinada área. Estes fatores são mais importantes do que a distribuição de rendimento, o exercício e outros comummente atribuídos ao excesso de peso. Ora, e aqui é que a porca torce o rabo, não se pode citar este estudo e ao mesmo tempo elogiar o OE: é que baixando o IVA na restauração aumenta-se o incentivo para a abertura de novos restaurantes, novos restaurantes, logo mais obesidade. E, já agora, alguns estudos citados no artigo demonstram que a subida do preço do tabaco também aumenta a obesidade (este OE sobe o preço do tabaco). É caso para dizer, o OE faz mal à saúde. Isto anda mesmo tudo ligado.
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