O Mundo de Manuela Ferreira Leite
Diário de Notícias, 080911
Pedro Lomba
Nos sábados em que vejo a coluna de Manuela Ferreira Leite no Expresso ocorrem-me sempre duas coisas: primeiro, que os comentadores que lamentam o "silêncio" da líder do PSD não pesquisam o suficiente. Não sugiro que todos compremos o Expresso para saber o que pensa Manuela Ferreira Leite. Mas parece-me que alguma matéria-prima haverá ali para não se acusar apenas Ferreira Leite de deserção.Também penso numa pergunta do historiador Pedro Lains que há uns tempos li num blogue: porque é que uma candidata a primeiro-ministro aparece em coluna individual, expondo-se mais do que recomenda a prudência? Mas logo me apercebo do erro: estranho seria Ferreira Leite acabar com as crónicas. É absurdo avaliar Manuela Ferreira Leite fora do mundo comportamental que é o dela. Essa é uma falha de certo jornalismo: sujeitar um político a testes de prestação sem antes tentar compreender quem ele é.Cada político cria o seu próprio ecossistema e sobrevive depois dentro dele. A política portuguesa dos últimos 15 anos é uma colecção de diferentes tipos de habitats: os políticos--manobristas, os políticos-conversa fiada e os políticos que estruturam a sua identidade reagindo contra os anteriores.O que sabemos no essencial sobre Manuela Ferreira Leite é que ela pertence à última classe. Quem a conhece de perto lembra como ela é intransigente com as manipulações sempre veladas do aparelhismo partidário. A sua aversão ao excesso de retórica e de pose, à política postiça, aos que "só falam" também é notória. A minha experiência pessoal com Manuela Ferreira Leite consiste nas reuniões da comissão política da candidatura de Cavaco Silva nas presidenciais. Recordo-me que, além da postura circunspecta e contida que sempre mantinha, Manuela Ferreira Leite nunca perdia o lado antidoutrinário e antiespeculativo. Se alguém subisse o discurso para níveis mais atmosféricos, Ferreira Leite remexia-se na cadeira. Isso pode explicar algumas das suas principais qualidades públicas: o facto de não ser ideologicamente rígida, de ser, como toda a gente, uma conservadora de temperamento e de olhar para a política com um critério quase profissional: há os políticos-conversa fiada e os políticos consistentes que falam daquilo que sabem.Os defeitos também são visíveis. Sendo uma política antiteórica, tem mais dificuldades em definir uma agenda inovadora que as pessoas rapidamente identifiquem. Dando-se pouco com quem não é como ela, só convence os já convencidos. O tema central das próximas eleições legislativas vai ser a ansiedade económica da classe média portuguesa. Na economia o PSD deixou o Governo sem especial credibilidade. Manuela Ferreira Leite vai precisar de ideias para a recuperar.
Pedro Lomba
Nos sábados em que vejo a coluna de Manuela Ferreira Leite no Expresso ocorrem-me sempre duas coisas: primeiro, que os comentadores que lamentam o "silêncio" da líder do PSD não pesquisam o suficiente. Não sugiro que todos compremos o Expresso para saber o que pensa Manuela Ferreira Leite. Mas parece-me que alguma matéria-prima haverá ali para não se acusar apenas Ferreira Leite de deserção.Também penso numa pergunta do historiador Pedro Lains que há uns tempos li num blogue: porque é que uma candidata a primeiro-ministro aparece em coluna individual, expondo-se mais do que recomenda a prudência? Mas logo me apercebo do erro: estranho seria Ferreira Leite acabar com as crónicas. É absurdo avaliar Manuela Ferreira Leite fora do mundo comportamental que é o dela. Essa é uma falha de certo jornalismo: sujeitar um político a testes de prestação sem antes tentar compreender quem ele é.Cada político cria o seu próprio ecossistema e sobrevive depois dentro dele. A política portuguesa dos últimos 15 anos é uma colecção de diferentes tipos de habitats: os políticos--manobristas, os políticos-conversa fiada e os políticos que estruturam a sua identidade reagindo contra os anteriores.O que sabemos no essencial sobre Manuela Ferreira Leite é que ela pertence à última classe. Quem a conhece de perto lembra como ela é intransigente com as manipulações sempre veladas do aparelhismo partidário. A sua aversão ao excesso de retórica e de pose, à política postiça, aos que "só falam" também é notória. A minha experiência pessoal com Manuela Ferreira Leite consiste nas reuniões da comissão política da candidatura de Cavaco Silva nas presidenciais. Recordo-me que, além da postura circunspecta e contida que sempre mantinha, Manuela Ferreira Leite nunca perdia o lado antidoutrinário e antiespeculativo. Se alguém subisse o discurso para níveis mais atmosféricos, Ferreira Leite remexia-se na cadeira. Isso pode explicar algumas das suas principais qualidades públicas: o facto de não ser ideologicamente rígida, de ser, como toda a gente, uma conservadora de temperamento e de olhar para a política com um critério quase profissional: há os políticos-conversa fiada e os políticos consistentes que falam daquilo que sabem.Os defeitos também são visíveis. Sendo uma política antiteórica, tem mais dificuldades em definir uma agenda inovadora que as pessoas rapidamente identifiquem. Dando-se pouco com quem não é como ela, só convence os já convencidos. O tema central das próximas eleições legislativas vai ser a ansiedade económica da classe média portuguesa. Na economia o PSD deixou o Governo sem especial credibilidade. Manuela Ferreira Leite vai precisar de ideias para a recuperar.
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Maria Teresa Carvalho