O caso do GNR que matou o filho do bandido

Henrique Raposo
Expresso, Quinta feira, 7 de novembro de 2013

Foragido da prisão há oito anos (assaltava velhinhas), Sandro decide roubar um armazém. Para o efeito, leva uma carrinha branca com o filho menor no banco do pendura. Como se sabe, os putos são bons para carregar coisas. À porta do armazém já assaltado, um GNR, Hugo Ernano, manda parar a carrinha. Sandro não está pelo ajustes, carrega no acelerador, tenta passar por cima do polícia, foge em alta velocidade. Hugo Ernano entra no carro de serviço, conduzido por um colega, começa a perseguição. Na proximidade de uma Casa do Gaiato cheia de meninos àquela hora, Ernano decide tentar imobilizar a carrinha com a pistola de serviço. Atira dois para o ar, e um para a roda esquerda. Apesar do embate, a carrinha continua. De seguida, Ernano decide atirar sobre a roda direita. Problema? Com o movimento do carro, os tiros sobem e atingem o filho do assaltante que ia no lugar do pendura, o lugar do morto. Perante este cenário, qual foi a decisão da excelsa justiça portuguesa? Um tribunal de Loures decidiu prender o polícia (nove anos) e dar uma indemnização de 20 mil euros ao assaltante devido à morte do filho. A parte relativa à indemnização é aberrante, a parte relativa à prisão do GNR é mais do que criticável.
Comecemos pela aberração. A indemnização é um insulto a qualquer código moral. Um bandido que transforma o filho no compincha de um assalto não pode receber 20 mil euros quando esse filho morre no decurso do assalto. A trágica morte da criança só podia agravar a pena inicial (2 anos por roubo) do pai, o grande responsável pela tragédia. Isto é tão absurdo, que até parece piada. Os nossos magistrados estão tão afastados da moral comum, que julgam impura e conspurcada pelo povinho, que acabam por produzir estas aberrações éticas. Estamos a falar da magistratura que é incapaz de prender um indivíduo que espanca um bebé.
E o que dizer da prisão do GNR? Bom, é certo que o agente em questão tem um historial de abusos. As leis que limitam o poder policial existem precisamente para proteger a sociedade destes excessos. Tenho amigos polícias em diversos departamentos. Quando começam com queixas relativas à burocracia e não sei quê, a minha reacção é sempre a mesma: num estado de direito, o trabalho da polícia deve ser complicado; se queres trabalho fácil, emigra para um estado policial. Eu não quero nas ruas de Lisboa uma polícia como o Bope, que atira para matar, que transforma o criminoso num inimigo. Mas também não quero esta magistratura portuguesa que queima de forma ideológica a autoridade da polícia. Nem um 8 marcial nem um 80 queridinho. Num país que dá penas suspensas a pedófilos, prender um polícia desta forma é um acto mais do que criticável. Tal como escreveu a juíza-presidente (que votou vencida), Hugo Ernano não teve intenções homicidas; revelou, no máximo, incompetência policial. Devia ser criticado, até podia ficar suspenso durante x meses, mas nunca devia ter sido tratado como um criminoso.
Voltamos sempre ao mesmo:  à justiça da ditadura, que tinha duas espadas, seguiu-se uma justiça com duas balanças.

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