A ideologia contra os contratos de associação

Alexandre Homem Cristo
Ionline, 2013-11-18

Neste debate, como em outros, a defesa da escola pública não é mais do que a defesa dos interesses dos professores

Todos os anos, há quem acuse o Estado de enriquecer colégios privados com dinheiros públicos. Bem, na verdade, os acusadores são sempre os mesmos (e as acusações também). Mas, apesar de não haver novidades, a recente insistência nessas acusações arrisca-se a impô-las como verdades. Não são. É, pois, importante explicar o que está em causa, nomeadamente em relação aos contratos de associação.
1. As escolas com contrato de associação têm um contrato com o Estado para prestar serviço público na área da educação, sendo por isso os seus custos de ensino suportados inteiramente pelo Estado, com base num valor fixo por turma. Porque prestam serviço público, não podem cobrar propinas ou seleccionar alunos. Na prática, são escolas públicas como qualquer outra.
2. Mesmo que impedidas legalmente de seleccionar alunos, há quem as acuse de o fazer. É falso que seja um modus operandi dessas escolas - e basta olhar para os rankings para o comprovar: muitas destas escolas estão no fundo devido ao perfil socioeconómico desfavorecido dos seus alunos. Mas, se houve casos isolados onde se seleccionou, então investigue-se. E investiguem-se também os casos de escolas públicas estatais que seleccionam alunos (há inúmeros documentados na imprensa) - afinal, o que é ilegal num caso também o é noutro.
3. Os dados orçamentais não indicam qualquer favorecimento aos privados. O esforço de ajustamento financeiro foi pedido a todos, incluindo às escolas com contrato de associação, cujas transferências têm diminuído sucessivamente. Entre 2010-2014, a verba transferida diminuiu 49 milhões de euros (menos 25%). E, assinale-se, estas transferências não representam uma "gordura do Estado" ou uma duplicação de custos. Os 149 milhões de euros que, em 2014, serão transferidos para estas escolas vão financiar os custos com o ensino dos alunos. Se estes alunos frequentassem escolas públicas estatais, o custo seria, em grande medida, o mesmo. Ou será que alguém achava que ficava de borla?
4. Questões financeiras à parte, há casos de duplicação da oferta? Sim. Porque se assinaram contratos onde já existia oferta pública suficiente - investigue-se porquê. Ou porque o Estado decidiu construir escolas onde já tinha contratos de associação assinados - i.e. onde era desnecessário. Mas, perante a duplicação, o que tantos pedem é o fim desses contratos de associação. Fechar a escola estatal não é sequer equacionado - o critério é o do proprietário e não o da qualidade do serviço prestado aos alunos. Ou seja, o que tantos pedem é que se feche uma escola, mesmo que seja a melhor, só porque não pertence ao Estado. E isso é cegueira ideológica.
5. Por fim, há quem acredite que as escolas com contrato de associação são uma excentricidade portuguesa. Não são. Estas escolas representam apenas 3% da rede e, de facto, a única particularidade de Portugal é estar entre os cinco países da UE27 com menos escolas privadas na rede pública. Muito longe, portanto, de Espanha (25%), França (21%) ou Holanda (67%).
Os ataques aos contratos de associação não nascem da ignorância, mas da ideologia. E, com a falta de alunos, alimentam-se da necessidade dos professores: quantos mais alunos houver nessas escolas, mais difícil será distribuir turmas aos professores nas escolas do Estado. Ora, neste debate, como em outros, a defesa da escola pública não é mais do que a defesa dos interesses dos professores. Que isso fique claro e que saibamos o que está em causa. E, não, não são os alunos.

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