O poderoso lóbi do Ministério da Educação

Henrique Monteiro
Expresso, Sábado, 9 de novembro de 2013

Eu penso que há uma falácia constante quando se fala de ensino privado. No geral, dá-se de barato que o ensino privado é algo com uma legitimidade menor do que o ensino público, ao mesmo tempo que se entende o postulado no artº 74 da Constituição como se tal implicasse que o Estado tenha a propriedade das escolas.
Vejamos o essencial do artigo em causa: incumbe ao Estado assegurar o ensino básico, universal, obrigatório e gratuito; incumbe ao Estado criar e desenvolver um sistema público, desenvolver o sistema geral de educação pré-escolar e inserir as escolas nas comunidades.
Ora, em lado nenhum se afirma que a propriedade e gestão das escolas têm de ser obra do Ministério da Educação. Essa é a falácia. Um sistema público e universal pode construir-se com propriedade privada, cooperativa, associativa ou pública. No sentido em que os transportes públicos em muitas regiões são de propriedade privada, o mesmo se passando com as farmácias. E isso não os impede de ter associações e contratos com o Estado, de modo a utilizar seja os passes sociais seja as comparticipações nos medicamentos.
Por isso, por exagero, toda a rede escolar poderia ser - sem beliscar a Constituição - de propriedade privada, cooperativa ou municipal sem que o Ministério da Educação deixasse de cumprir o seu programa, desde que financiasse (com tetos máximos e bem estudados) o custo de cada aluno nas escolas.
Acontece que há uma segunda falácia, que tem a ver com o facto de se ter demonstrado que grupos concretos de escolas privadas - nomeadamente um chamado GPS - conseguem condições do Estado que não deveriam conseguir. Claro que isto é condenável, mas a falácia reside no facto de não se querer ver que essas condições só existem porque são concedidas pelo Estado. E são-no devido à posição quase monopolista que este tem na Educação. Ou seja, é a possibilidade que o Estado tem de privilegiar e discriminar que permite que grupos de ex-políticos funcionem na educação com as benesses do Ministério. O principal crime cometido contra a comunidade é - neste e noutros casos - cometido pelo Estado.
Ao mesmo tempo, obscurece-se o papel que muitos colégios privados têm na nossa educação (do Moderno, onde eu estudei, ao Valsassina e outros colégios laicos, àqueles que como o São João de Brito, Salesianos, Maristas, etc. têm orientação religiosa). Dirão que são colégios de elite. É certo! Mas visitei muitas escolas do Estado com instalações muito melhores do que as destes colégios chamados de elite; assim como conheço escolas públicas frequentadas por elites semelhantes às que frequentam esses colégios.
Ninguém - penso que nem o Governo que é sempre o principal suspeito de tudo - quer tirar ao Estado a capacidade de definir as metas de aprendizagem, o essencial dos programas escolares e as avaliações finais. Mas tem-se pretendido que o Estado, além destas incumbências que devem ser suas, tenha também o poder de dar emprego aos professores, de contratar empreiteiros para as construções e reparações de escolas, enfim, de controlar tudo quanto mexe na educação.
Não é a Constituição que está em causa. Quem fica em causa com a liberdade de escolha na educação é um poderosíssimo lóbi que há demasiados anos delapida milhões que já foram gastos naquele gigante insaciável que é o Ministério da Educação.

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