O Natal não é das crianças
Inês Teotónio Pereira , i-online, 22 Dez 2012
Mesmo quando era criança não entendia a lógica. Já na altura achava que era uma espécie de apropriação indevida e de certa forma gananciosa
Nunca percebi porque é que o Natal é uma festa das crianças. Mesmo quando era criança não entendia a lógica. Já na altura achava que era uma espécie de apropriação indevida e de certa forma gananciosa de uma festa da qual eu não tinha tido responsabilidade nenhuma. O aniversário sim. O meu aniversário era a minha festa (é certo que não fiz nada para nascer, mas por mais voltas que se dê a verdade é que o centro da festa só podia ser eu – eu é que nasci, logo eu devia receber presentes).
Ora no Natal não. No Natal quem nasceu foi o Menino Jesus. Sendo assim, porque é que o Natal “é” das crianças? Deixei de pensar sobre este assunto muito cedo e vivi muito bem com os presentes e com essa homenagem ao meu estado infantil. Quem era eu para questionar, vá, um costume social desta dimensão? E venham a mim os presentinhos.
No entanto, continuo sem entender. Além da festa óbvia que é a festa cristã – o nascimento de Cristo e com o Seu nascimento o anúncio da vida eterna – até compreendo quando se diz que o Natal é a festa da família. A família, como paralelo da sagrada família, em que o exemplo é o amor que une os seus membros. Enfim, faz sentido. Mesmo para aqueles que não sejam cristãos. A família é a família, e quando falamos de alegria, de amor, etc., a família está sempre no centro seja qual for a religião, o credo ou a disposição para cumprir.
No entanto, continua a minha dúvida: o que é que as crianças têm a ver com o Natal mais do que os restantes mortais? Porque é que a festa é delas e não é, por exemplo, dos jovens ou das pessoas de meia-idade, que tanto precisam que o mundo vele por elas. Ah, ok, as crianças, assim como o Menino Jesus, nasceram. Mas então também os adultos nasceram um dia e lá por ter sido há mais tempo o seu nascimento não tem menos mérito. Não acho justo. Reivindico, se for esta razão que indica o Natal como uma festa das crianças, que o Natal passe a ser uma festa da malta entre os 40 e os 45 anos, que está a braços com uma crise de identidade feroz e que não está ainda preparada para ser tratada com reverência pelos estupores de 30 que se acham adolescentes.
Pois, eu acho que a versão que me parece próxima da realidade e que se prende com esta substituição abrupta do Menino Jesus pelas crianças em geral tem a ver com os presentes: o Menino Jesus recebeu presente, por isso (e por causa do S. Nicolau) todos recebem presentes. E quem é que gosta mais de receber presentes? Ah, pois é, são as crianças. As crianças pelam-se pelos presentes. Sem presentes não há Natal. Pode não haver peru, missa do galo, bacalhau, azevinho, não interessa. O que interessa são os presentes. É mesmo assim, não é defeito, é a consequência lógica do estado infantil: querer coisas. Ora dedicando o Natal às crianças estamos a centrar o Natal naquilo que mais criticamos: o materialismo, os presentes e essas coisas fúteis. E lá se vai o Menino Jesus, o amor, a família e tudo isso que aparece no anúncio do azeite Galo.
Então qual é a solução? É seguir a lógica: o Natal é uma festa de quem? De todos, de crentes e de não crentes. E o que é devemos fazer no Natal? Ser generosos, partilhar, ser um bocadinho melhores pessoas que no resto do ano. Sendo assim, são as crianças a prioridade da nossa partilha, da nossa generosidade. Também. Mas a tia velhinha que passa o ano inteiro num lar devia estar primeiro, assim como as crianças que não têm uma família que as acolha deviam ser a nossa prioridade.
O Natal não tem a ver com a idade, tem a ver com a nossa resposta às necessidades de quem nos rodeia. Sejam crianças, sejam jovens adultos ou idosos. E muitas vezes as necessidades de muitas crianças não são necessidades, são caprichos. As dos meus filhos, por exemplo, são.
Mesmo quando era criança não entendia a lógica. Já na altura achava que era uma espécie de apropriação indevida e de certa forma gananciosa
Nunca percebi porque é que o Natal é uma festa das crianças. Mesmo quando era criança não entendia a lógica. Já na altura achava que era uma espécie de apropriação indevida e de certa forma gananciosa de uma festa da qual eu não tinha tido responsabilidade nenhuma. O aniversário sim. O meu aniversário era a minha festa (é certo que não fiz nada para nascer, mas por mais voltas que se dê a verdade é que o centro da festa só podia ser eu – eu é que nasci, logo eu devia receber presentes).
Ora no Natal não. No Natal quem nasceu foi o Menino Jesus. Sendo assim, porque é que o Natal “é” das crianças? Deixei de pensar sobre este assunto muito cedo e vivi muito bem com os presentes e com essa homenagem ao meu estado infantil. Quem era eu para questionar, vá, um costume social desta dimensão? E venham a mim os presentinhos.
No entanto, continuo sem entender. Além da festa óbvia que é a festa cristã – o nascimento de Cristo e com o Seu nascimento o anúncio da vida eterna – até compreendo quando se diz que o Natal é a festa da família. A família, como paralelo da sagrada família, em que o exemplo é o amor que une os seus membros. Enfim, faz sentido. Mesmo para aqueles que não sejam cristãos. A família é a família, e quando falamos de alegria, de amor, etc., a família está sempre no centro seja qual for a religião, o credo ou a disposição para cumprir.
No entanto, continua a minha dúvida: o que é que as crianças têm a ver com o Natal mais do que os restantes mortais? Porque é que a festa é delas e não é, por exemplo, dos jovens ou das pessoas de meia-idade, que tanto precisam que o mundo vele por elas. Ah, ok, as crianças, assim como o Menino Jesus, nasceram. Mas então também os adultos nasceram um dia e lá por ter sido há mais tempo o seu nascimento não tem menos mérito. Não acho justo. Reivindico, se for esta razão que indica o Natal como uma festa das crianças, que o Natal passe a ser uma festa da malta entre os 40 e os 45 anos, que está a braços com uma crise de identidade feroz e que não está ainda preparada para ser tratada com reverência pelos estupores de 30 que se acham adolescentes.
Pois, eu acho que a versão que me parece próxima da realidade e que se prende com esta substituição abrupta do Menino Jesus pelas crianças em geral tem a ver com os presentes: o Menino Jesus recebeu presente, por isso (e por causa do S. Nicolau) todos recebem presentes. E quem é que gosta mais de receber presentes? Ah, pois é, são as crianças. As crianças pelam-se pelos presentes. Sem presentes não há Natal. Pode não haver peru, missa do galo, bacalhau, azevinho, não interessa. O que interessa são os presentes. É mesmo assim, não é defeito, é a consequência lógica do estado infantil: querer coisas. Ora dedicando o Natal às crianças estamos a centrar o Natal naquilo que mais criticamos: o materialismo, os presentes e essas coisas fúteis. E lá se vai o Menino Jesus, o amor, a família e tudo isso que aparece no anúncio do azeite Galo.
Então qual é a solução? É seguir a lógica: o Natal é uma festa de quem? De todos, de crentes e de não crentes. E o que é devemos fazer no Natal? Ser generosos, partilhar, ser um bocadinho melhores pessoas que no resto do ano. Sendo assim, são as crianças a prioridade da nossa partilha, da nossa generosidade. Também. Mas a tia velhinha que passa o ano inteiro num lar devia estar primeiro, assim como as crianças que não têm uma família que as acolha deviam ser a nossa prioridade.
O Natal não tem a ver com a idade, tem a ver com a nossa resposta às necessidades de quem nos rodeia. Sejam crianças, sejam jovens adultos ou idosos. E muitas vezes as necessidades de muitas crianças não são necessidades, são caprichos. As dos meus filhos, por exemplo, são.
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