Bisbilhotice mata

Miguel Esteves Cardoso
09/12/2012 - 00:00

É mesmo muito triste o suicídio de Jacintha Saldanha, a enfermeira que foi enganada por dois australianos que fingiram ser a Rainha e o príncipe Carlos. Até o Guardian escreveu que, para o Hospital Edward VII ("a instituição médica de eleição da famíla real"), "a chamada foi profundamente embaraçosa".
O hospital diz que não repreendeu a enfermeira. O porta-voz da Rainha fez questão de transmitir que o Palácio de St. James não se tinha queixado do incidente "at no point".
Os autores da brincadeira, Mel Greig e Michael Christian, não só ficaram chocados com a notícia como foram suspensos pela estação de rádio. A imprensa inglesa, vergonhosamente, parece querer culpá-los do provável suicídio da enfermeira. As chamadas telefónicas a fingir - prank calls - existem, pelo menos, desde os meus treze anos, que fui praticante de muitas. Tornaram-se públicas e profissionalizaram-se nos anos 90, tendo feito rir, no princípio, muito boa gente.
A diabolização dos dois apresentadores australianos é inaceitável. Ninguém tem culpa. Não é essa a tragédia. A tragédia é que uma pessoa se matou sem razão para se matar. Foi vítima de um princípio de honradez que ela tinha: foi pena ter sido tão honrada. Se alguém tem culpa é a curiosidade pública à volta da gravidez da mulher que casou com o filho mais velho do príncipe Carlos. A curiosidade pública é um monstro bisbilhoteiro e é muito pior do que os monstrengos que decidem ganhar a vida a saciá-la.

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