O haraquíri do jornalismo

João Távora
Propaganda, 2012-12-26

O caso Baptista da Silva é todo ele uma irónica parábola sobre a crise que por estes dias perpassa e se agudiza nos media tradicionais. É curioso como o burlão, promovido por um jornalista de nomeada de um semanário de referência nacional não tenha sido denunciado pelas “convenientes” intrujices que proferiu em vários palcos, mas antes pela descoberta do seu falso curriculum. Como sempre em Portugal o que conta é o estatuto.
Numa altura em que através das novas plataformas “sociais” tanto a opinião e análise de qualidade quanto a gestão de agenda politica ou corporativa se autonomizam cada vez mais dos meios de comunicação institucionais, não tenho dúvidas que a prazo poucos deles resistirão no actual modelo de gestão. Apenas irão sobreviver os que fundarem a sua actividade na excelência do profissionalismo, reflectindo os factos de forma isenta, analisados por atentos e meticulosos peritos, que sejam capazes de aferir discursos coerentes ou contestar raciocínios viciados ou cálculos mentirosos. Para alimentar conversas de café e amplificar bitaites sectários, já há para aí batalhões de blogues e ávidos activistas das redes sociais. Deixar-se seduzir e enredar nesta lógica é simplesmente o haraquíri do jornalismo. 

Comentários

Bento Sarmento disse…
É uma observação profunda. Mas creio que deve ser complementada com uma nota de espanto: o dito jornalista dizia na TV que ía processar o homem, esquecendo-se que tinha infringido o seu dever ético de verificar a fonte! Afinal nós, que comprámos o jornal é que fomos defraudados por ele, teríamos assim o direito de nos considerarmos burlados... Estamos numa fase em que o jornalismo se transformou num instrumento de poder e de amplificação das opiniões que agradam aos que têm à sua disposição a rotativa ou o microfone, já pouco tendo a ver com a nobre profissão de informar com rigor e isenção.

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