Os escondidos
Numa esplanada cheia de pessoas um rapaz de nove anos anda de gatas atrás de nós, escondendo-se não sabemos de quem. Salta para debaixo de outra mesa, sempre olhando na mesma direcção: presumivelmente para quem estava à procura dele.
Era impressionante a dissimulação astuta do rapaz. Era crescido de mais para estar a brincar sozinho e novo de mais para ser paranóico. Era insensível ao desconforto intrusivo que causava às pessoas.
Passados uns bons minutos percebi que não havia ninguém à procura dele. Foi quando ele se revelou, levantando-se e abrindo os braços, num grande gesto "tarã! Aqui estou!" Ninguém reparou, a não ser as pessoas que ele tinha incomodado, que não o conheciam.
Percebi que ele estava a esconder-se de quem não o procurava, na esperança vã de estar a ser procurado. Ele escondia-se porque queria ser procurado. Mas ninguém o procurava.
Ele não estava sozinho, apesar de estar. Somos tantos aqueles que nos escondemos, como se nos procurassem, que me comoveu imediatamente a beleza da futilidade daquele exercício.
A atenção dos outros – a começar por aquela que nos prestam (ou não) aqueles que amamos – é a droga mais viciante de todas. É tão fácil confundi-la com o amor que, cada vez que é possível, esquecemo-nos felizmente das diferenças, que são todas e mais uma.
Todos nós estamos escondidos. Escondemo-nos, inutilmente, de quem não nos procura. Mas o facto de nos escondermos dá-nos a ilusão, vital, de sermos procurados.
Comentários