PADRE AMÉRICO
Foi a 16 de Julho de 1956, há 59 anos, que a morte encontrou o Padre Américo, ou Pai Américo. O dever da Memória obriga-nos a evocar este Profeta do nosso século XX.
A sua Biografia é-nos apresentada pelo site da Casa do Gaiato:
O Padre Américo- PAI AMÉRICO – cujo nome completo é Américo Monteiro de Aguiar, foi o oitavo filho dum família cristã. Nasceu em 23 de Outubro de 1887 na freguesia de Galegos, concelho de Penafiel.Depois dos estudos preliminares, enverda pela carreira comercial. Trabalha primeiro no Porto, e em 1906 segue para Moçambique. Aos 36 anos volta à Metrópole e ingressa no Convento Franciscano de Vilariño de Ramallosa, Espanha, onde toma o hábito em 14 de Agosto de 1924, do qual sai após dois anos de vida conventual; e sendo-lhe recusada entrada no Seminário do Porto, é recebido no de Coimbra, em 1925.Recebe a Ordenação sacerdotal em 29 de Julho de 1929 e encarrega-se da Sopa dos Pobres, em Coimbra. «Doente como então era- disse- o meu Prelado havia-me dispensado de todas as obrigações, tendo eu tomado esta de visitar Pobres por não servir para mais nada…». Dedica-se ao apostolado da Caridade nos tugúriosde famílias em dificuldades. Visita hospitais e cadeias. De 1935 a 1939 organiza Colónias de Campo em S. Pedro de Alva, ceira e Miranda do Corvo; e funda o Lar do Ex-Pupilo dos Reformatórios, na Rua da Trindade, Coimbra, em 1 de Janeiro de 1941, depois entregue aos serviços Tutelares de Menores em 1950.Da trilogia– Casas do Gaiato, Património dos Pobres, Calvário–adiante se informará.A morte surgiu no Hospital Geral de Santo António, do Porto, a 16 de Julho de 1956 (aos 68 anos), em consequência dum desastre de automóvel em S. Martinho do Campo, Valongo, no regresso duma viagem ao sul do País.Foi exumado a 15 de Julho de 1961, no cemitério paroquial de Paço de Sousa, e trasladado no dia 17 para a Capela da Casa do Gaiato de Paço de Sousa, onde jaz em campa rasa- como fora seu desejo.
No livro «Padre Américo, páginas escolhidas e documentário fotográfico», publicado em 2008 no Porto, podemos encontrar os seguintes excertos das suas crónicas, que durante anos mantiveram o crivo da sua profecia:
«Ontem apresentaram-se quatro. Já tinham chegado há dias, mas, como eu estivesse ausente, eles comiam na cozinha do forno e dormiam no palheiro, à espera. Quatro. Três de Santo Tirso e um fugido a um circo, que não se sabe de onde é! O orador era um dos de Santo Tirso. Não tinha papas na língua. A causa dele e dos outros era muito bem defendida. Depois falei eu. Quatro – nem pensar. Se fosse um, talvez se desse um jeito; assim, não.Comeram o caldo. Dei a cada um sua moeda de prata e com isso os despedi. À noitinha, sinto bater à porta do meu escritório. Era um dos desgrenhados. Cá estou! É o do circo. É o que não tem ninguém. Traz a moeda de prata que antes lhe dera e entregou-ma! “Os de Santo Tirso”, disse ele, “sempre têm por lá alguma família; eu é que não.” Esta foi a doutrina do pequenino concílio que eles houveram, entre si, a uns tanto quilómetros da nossa Aldeia. Os “Pàrias” a fazerem doutrina. O “esterco” a ensinar: “Sim. Vai tu que não tens ninguém”. Oh, Homens das Esquerdas e das Direitas, encontrai-vos aqui e chorai!»
(…)
«Chegou-nos um pequeno que parece andar na casa dos dez. Ao que apurei, ele tem a mãe na cadeia, ia comer o rancho às grades e mendigava nas redondezas. Como estamos em maré de piões e há setenta deles a bailar cá em Casa, o Manuel, que assim se chama o novo gaiato, compreendeu num relance que a vida aqui não é para penas e começou a jogar. Na tarde desse mesmo dia, foi visto mais os do campo a comparticipar dos seus trabalhos e infinita alegria. Tem uns olhos cheios de expressão. Narra a tragédia da vida sem saber medir, pela idade que tem, a altura da sua desgraça.-“Andava um homem mais nós, mas agora não quer saber”. Era um grupo de pedintes de feiras. A prisão da mulher afastou o homem e ficou o pequenino preso ao amor da mãe, que é o derradeiro a quebrar. Ela reparte do seu minguado rancho, nem se lhe dava de abrir as veias, que o amor tem mais força do que a morte. O ferro das grades não impede que ela se aproxime do fruto da sua fraqueza. Eu não me atrevo a chamar-lhe fruto do seu pecado; que o digam os mais.– “Roubou na feira de Margaride, já está presa há mais de um ano”. E o pequenino Manuel vai desfiando contas de amarguras que não sente, enquanto o adormeço num leito de roupa lavada. Soube mais: que o pai da condenada é um proprietário do Minho, que não quis receber a filha por lhe ter caído uma nódoa. Se o pai soubesse perdoar, tanto bastaria para lavar a primeira nódoa e não teríamos hoje a enlameada. Quer-me parecer que o verdadeiro pecado vem do acto do pai!»
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