As duas luvas

Público
02.01.2009, António Barreto

Tinha de ser. Depois do discurso de 29 deste mês, sobre o Estatuto dos Açores, era quase obrigatório que a luva branca substituísse a de boxe, então utilizada. Há três dias, o Presidente Cavaco Silva acusou, com razão, o Governo e o Parlamento (assim como os partidos políticos que o compõem) de deslealdade, de colocar os interesses partidários de ocasião acima do interesse nacional e de aprovar soluções absurdas.
A intervenção do Presidente da República, a propósito do Ano Novo, traduz as suas preocupações essenciais (que pertencem ao domínio da economia), reflecte as suas especiais competências (económicas e financeiras) e traça um retrato inquietante da situação do país. Apenas alude, de passagem, aos partidos ou ao Governo, quando os convida a deixar de lado as querelas desnecessárias e diz que nem sempre se percebe a agenda da classe política. Mas o elogio da verdade e a crítica das ilusões e das fantasias também lhes podem ser dirigidas.Para o resto, o mais importante, os seus comentários são oportunos. Recorda a quase estagnação em que vivemos e os oito anos de crescente atraso de Portugal relativamente aos países europeus. Recomenda precaução nos investimentos públicos. Apela às energias virtuais ou potenciais dos portugueses. E relembra aquelas que deveriam ser as prioridades estratégicas dos poderes públicos. As suas referências aos agricultores (que não recebem os fundos europeus a que têm direito), aos jovens sem emprego, aos pequenos comerciantes e aos trabalhadores desempregados são honestas e próprias da quadra.
Uma reflexão breve sobre estes dois discursos sugere conclusões graves. Por culpa do Governo e dos partidos, as boas relações entre o Presidente e o Governo ou o Parlamento terminaram. Por vontade do Governo, que quis designar um adversário, a cooperação estratégica parece agora resumir-se às obrigações de cada um. O "sistema Sócrates" só tem agora um contrapoder real, o do Presidente da República. Sociólogo

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