A ultima aula deste sistema de ensino

Público, 19.11.2008, Rui Ramos

Os sindicatos e movimentos de professores, se vencerem o ministério, estão condenados a cair com ele

aprenderam a lição? Tendo trocado os gabinetes e as salas de aula pelas ruas e conferências de imprensa, há meses que governantes e professores se esforçam por ensinar a toda a gente que o sistema público de educação, tal como existe, só pode ser um quebra-cabeças. Criado para ser a solução de todos os problemas, tornou-se o problema de todas as soluções. Talvez tenha chegado o momento de pensar radicalmente noutra coisa.
A educação foi sempre aquilo a que os políticos portugueses recorreram quando não sabiam o que fazer, ou não queriam fazer coisas mais complicadas. Desde há anos que a sabedoria internacional e nacional assentou no pacote de mudanças indispensáveis para dar aos portugueses novas oportunidades de enriquecer. Mas a maior parte - diminuir o peso do Estado, corrigir a rigidez e falta de concorrência dos nossos mercados, tornar a justiça eficiente - são reformas ingratas. Para qualquer governo, só duas das recomendações prometem boa disposição: construir estradas e povoar as escolas. Em ambos os casos, trata-se de gastar mais e criar empregos, o que agrada a todos.
Chegámos assim a ser um dos países europeus com mais auto-estradas e que, em relação à sua riqueza, mais despende com o sistema de ensino. Por volta de 2001, porém, houve que reconhecer que, quanto mais alcatroado e diplomado, menos o país prosperava. Voltou-se a falar das tais "reformas estruturais". Os mais hábeis, porém, logo descobriram como fugir à seringa. Por um lado, havia novas tecnologias para experimentar. Por outro lado, o sistema de ensino não estava a funcionar bem. Mais despesa não significara mais sucesso. Muita gente continuava de fora, e os resultados em testes internacionais eram humilhantes.
O actual Governo pôde assim voltar, com boa consciência, às soluções de sempre. Ao lado dos aviões e comboios, continuou a célebre "paixão da educação". Desta vez, no entanto, a abordagem foi menos agradável. O Governo aproveitou a centralização e burocratização do sistema estatal de ensino a fim de tentar, de cima para baixo, arrancar às escolas, com a menor despesa possível, os números necessários para poupar ao país as mais óbvias vergonhas estatísticas. O regime de avaliação dos professores ou o das faltas dos alunos foram peças dessa campanha de produtividade.
O ministério, para manter o actual sistema de ensino, precisa de provar que é reformável. Os professores, incomodados nas suas velhas rotinas e confortos, decidiram provar o contrário. A decorrente zaragata tem sido curiosa. Poucas vezes em Portugal se viu os dois lados de um debate precisar de recorrer tanto à hipocrisia: empenhado em remover as regalias e poderes da classe, o ministério jura no entanto ser "sensível" aos professores; os professores garantem que querem as "reformas", quando - como classe profissional envelhecida e sem a perspectiva de grandes recompensas - não têm verdadeiramente motivos para as desejar. Lá fora, o público, que não gosta dos professores ("privilegiados") e aprendeu a desconfiar das melhorias anunciadas pelo Governo, mantém-se geralmente céptico. O ministério, apesar das sondagens de opinião, e os sindicatos, apesar das marchas de fim-de-semana, fazem a guerra sozinhos.
A ministra da educação está para o actual sistema público de ensino como Marcello Caetano para o Estado Novo. Se falhar, perante os ultras do sindicalismo e da movimentação, vamos ver quase de certeza, nos próximos tempos, o 25 de Abril educativo que alguns andam a reclamar há anos: autonomia e governo próprio das escolas (já quase toda a gente aprendeu a falar disso), novas formas de financiamento (dirigido às famílias e não aos estabelecimentos de ensino), integração de escolas estatais e privadas num mesmo sistema público concorrencial, avaliação de escolas e professores baseada nos resultados dos exames, e por aí fora. É o que falta experimentar, e há-de provavelmente ser experimentado. Mais não seja, por simples falta de alternativa, depois do colapso das actuais reformas.
Os sindicatos e movimentos de professores, se vencerem o ministério, estão condenados a cair com ele, como aconteceu aos sindicatos e aos movimentos que em Inglaterra, em 1979, destruíram o governo de James Callaghan. Sem a obstinada e turbulenta resistência sindical às reformas do gabinete trabalhista, num país então estagnado como está agora Portugal, não teria sido possível a revolução thatcheriana da década de 1980.
As grandes mudanças começam sempre assim, por linhas tortas. Historiador

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