ARREPENDIMENTO E PERDÃO
José Luís Nunes Martins, Facebook, 2015.05.09
Mais do que uma penosa recordação, o arrependimento é a amarga pena (duro castigo) que sente uma boa consciência depois de se dar conta da autoria de um mau gesto. O arrependimento, mais do que um simples sofrimento é, na sua essência, uma vontade de reparar de forma eficaz e diligente o mal de que se foi protagonista. O passado não se altera, mas o futuro pode sempre ser diferente. Impedindo a repetição do erro e fazendo o possível por se ser digno de perdão... tudo isto, ainda que o gesto mau tenha sido resultado de uma intenção equívoca ou de um simples desleixo.
Há quem acumule erros em forma de vícios. Chegando até a considerar como mera formalidade um simples pedido de desculpa ou até uma qualquer penitência mais pesada, algo que significa um custo, mas que, ponderadas todas as variáveis... vale a pena... realizam a maldade já a contar com a penitência que (segundo julgam) a anulará...
Todos temos um pouco desta grande hipocrisia. Ao invés de repararmos os erros, apenas os intervalamos com tempos de... aparente consciência. Chega a haver quem prefira sentir pesados remorsos a ter de se decidir a fazer alguma coisa para os remediar.
Só o verdadeiro arrependimento pode colocar fim a uma série de desgraças. Estas tendem a suceder-se, na medida em que depois da primeira, todas as demais não costumam ser, aos olhos do seu autor, senão uma forma de dividir a mesma culpa por mais do que um gesto... acredita-se que o mal não se multiplica, mas que, através desta repetição, se divide e faz menor. Na verdade, acrescenta-se culpa à culpa, na tentativa de tentar justificar uma suposta inocência.
O arrependimento não torna as faltas piores, apenas as coloca a descoberto, tal como são: más.
Um dos efeitos do arrependimento é a humildade que introduz na existência de quem o assume. Afinal, se cometemos um erro uma vez, por que razão não o voltaremos a fazer? Mais do que nos pesar o passado, pesa-nos também o que ainda podemos fazer de pior... sendo que a delicadeza desta sábia admiração da nossa fragilidade permite evitar muitas falhas graves.
O arrependimento, por si só, não absolve ninguém. Só a vítima da maldade a pode perdoar. Mas tal não tem qualquer relação com a existência do arrependimento... quem perdoa pode fazê-lo a quem está arrependido ou não. Quem é perdoado, só o é se estiver arrependido...
Em boa parte dos casos, o perdão provém quem se reconhece incapaz de conhecer os porquês do outro e assim se obriga a não o condenar, amando-o em vez de o julgar.
Também há quem não perdoe para que ao castigo do arrependimento se some ainda mais dor... uma espécie de condenação que torne evidente o dano causado... mas, claro, por vezes é apenas uma vingança.
Há até quem não se perdoe a si mesmo, apesar de saber da verdade do seu próprio arrependimento.
O arrependimento supõe não só o sofrimento da culpa pela autoria do mal, mas também a vontade esclarecida de entregar todo o futuro como penhor da falta cometida... Ao arrepender-me traço um esboço do ser no qual me devo tornar.
O arrependimento faz-nos pender para trás através do peso da falta cometida. Só uma tensão firme para diante nos pode fazer recuperar a verticalidade. Apenas um compromisso sério e determinado nos pode fazer mover no sentido do bem futuro, apesar do mal passado.
Quando falhamos devemos estender a mão e pedir perdão... mas, da mesma forma que um mendigo que suplica uma esmola sabe que ela não é obrigação de ninguém, assim também quem pede perdão nunca o deve ter por garantido ou justo... por mais sincero e profundo que seja o seu arrependimento.
Perdoar é per-doar, conceder um dom, dar mais do que é comum. Doar algo de sublime. Gesto divino, faz sofrer quem o concede, muito mais do que quem o recebe.... Quem perdoa acaba por partilhar um sofrer que não era seu... mas passou a ser.
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