«Is there a Santa Claus?»
José Maria C.S. André
«Correio dos Açores», Natal 2014
Um editorial do jornal norte-americano «The Sun», de 1897 (sim!, do século XIX!), ficou tão popular que ainda hoje é conhecido e considerado um clássico. Dizem que faz parte da história dos EUA. O pequeno texto, intitulado «Is there a Santa Claus?», é a resposta a uma minúscula carta ao Director, enviada por uma menina de 8 anos. O editorial teve um tal impacto que inspirou filmes e programas de televisão, canções, livros e peças de museu. E o original da pequenina carta, na realidade um pequeno quadrado de papel rabiscado por uma criança, está avaliado em dezenas de milhares de dólares, mais cobiçado que muitos documentos históricos importantes.
Esta parte do jornal de 1897 pode ler-se nesta reprodução fotográfica:
Porque é que este editorial teve tanto impacto? O que dizia a carta?
A criança, Virginia O'Halon, perguntou se o Pai Natal (Santa Claus, em inglês) existia e o jornal respondeu que sim. A frase mais célebre do artigo é «Yes, Virginia, there is a Santa Claus» (pois é, Virginia, existe um Pai Natal) que, de tão repetida, se tornou uma expressão idiomática nos Estados Unidos.
Se alguém não conhece este editorial do «The Sun», pode ler estas quatro citações, que resumem o essencial:
«Virginia, os teus amiguinhos [que desconfiam do Pai Natal] não têm razão. Eles estão influenciados pelo cepticismo destes tempos cépticos. Eles só acreditam no que vêem».
«Pois é, Virginia, existe um Pai Natal. É tão certo ele existir, como o amor e a generosidade e a dedicação, e sabes como eles se encontram em todo o lado e enchem a vida com a sua beleza mais sublime e a alegria».
«O mundo seria terrível sem o Pai Natal (...). Não haveria poesia, nem romance para tornarem esta vida tolerável. Não teríamos gosto, excepto no que se toca e se vê».
«Isto é real? Ah, Virginia, só isto, neste mundo, é real e eterno».
Não sei o que um leitor açoriano acha destas divagações. A cidade de Nova York comoveu-se e a emoção alastrou a todo o país e continua, passado mais de um século.
Claro que há qualquer coisa de importante neste elogio do sonho; se não tocasse o coração humano, já ninguém se lembrava do episódio.
As histórias de crianças têm valor, transmitem a realidade. A Bela Adormecida, ou o Pinóquio, ou os Três Porquinhos, significam algo para além do enredo. Como a história da água que dança, da maçã que canta e do pássaro que fala. Ou a história pungente do rouxinol e da rosa («The Nightingale and the Rose»), de Oscar Wilde.
Eu compreendo todas estas histórias, excepto a do Pai Natal. Não nasci nos Estados Unidos. Aqueles gorduchos vermelhos não me dizem respeito. Gosto mais da água que dança e do pássaro que fala.
De qualquer modo, o Natal, o nascimento de Jesus Cristo, é outra história, absolutamente incomparável. Com muito mais ternura! Com uma lição muito mais forte de amor, de alegria de viver, de capacidade de resistir. É a diferença entre um conto pelo qual ninguém arriscaria a vida e um facto que justifica a lealdade heróica dos mártires. É a diferença entre a simples imagem e a realidade propriamente dita.
O Natal é de um realismo impressionante, por isso precisa também do sonho. A parte do sonho são os presépios enfeitados com musgo e estrelas de papel, são as guloseimas e as canções. Todos nós precisamos disso, desse bocadinho de sonho que nos empurra para dentro da realidade. A barriga do Pai Natal não empurra para lado nenhum, mas, minha querida Virginia, Jesus verdadeiro sorri. Sabemos que nos vê e gosta de nós, mas precisamos do presépio para olhar para Ele e sorrirmos também.
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