SALOMÃO, PRECISA-SE!
Pe. Gonçalo Portocarrero de Almada
Público 2013-07-21
Uma falsa solução para um problema que não existe
A co-adopção, mais do que uma questão psicológica ou antropológica, é ética e jurídica. A psicologia e a antropologia são ciências descritivas, que observam as tendências sociais dominantes, mas a ética e o direito são saberes normativos, ou seja, estabelecem os valores e princípios por que se deve reger a vida social.
O que agora está em causa é o reconhecimento social e jurídico de uma filiação não-natural que, de algum modo, viria a consagrar as uniões de pessoas do mesmo sexo ao nível das dos casais naturais. Em termos estritamente conjugais, essa equiparação já existe na lei, desde que se permitiu o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Mas não no que respeita à filiação, porque o parceiro do progenitor não pode co-adoptar, nem duas pessoas do mesmo sexo podem ser adoptantes.
Paradoxalmente, os defensores desta reforma legislativa afirmam, por um lado, a necessidade da criança, filha de um progenitor unido a uma outra pessoa do mesmo sexo, poder ser por esta co-adoptada. Mas, por outro, dizem que, de facto, já há menores que vivem com a mãe, ou com o pai, e o respectivo companheiro do mesmo sexo, numa situação da mais absoluta normalidade e felicidade. Ou seja, querem solucionar um problema que, na prática, reconhecem não existir. Se assim é, porque pretendem então alterar o estatuto legal do parceiro do progenitor se, mesmo sem ser legalmente segundo pai, ou segunda mãe, já pode proporcionar e, segundo eles, de facto proporciona, um tão efectivo bem-estar ao menor?! Ao que parece, a criança é apenas um pretexto para uma conquista ideológica que, na realidade, interessa mais aos ditos companheiros dos pais, do que aos filhos destes.
Dir-se-á que, se o parceiro da mãe, ou do pai, for também reconhecido legalmente como segunda mãe, ou pai, terá responsabilidades parentais que beneficiarão o menor em causa. Mas, para ir buscar uma criança à escola, ou para, na ausência de um progenitor, tomar alguma decisão urgente em relação à sua saúde, não é preciso dar-lhe o estatuto de pai, ou de mãe, que, obviamente, seria falso e, até, potenciador de futuros conflitos familiares.
Com efeito, se já é problemática a regulação do poder paternal em casais desavindos, como será entre um progenitor verdadeiro e o seu duplo?! Uma mãe, ou pai, tem alguns direitos em relação a um seu filho, não por força da sua relação com o pai, ou mãe, mas em virtude da sua própria, pessoal e intransferível parentalidade. Que direito assistiria ao ex-parceiro do pai, ou da mãe, se não fosse progenitor?! O filho tem direitos e deveres em relação aos seus pais, não porque ambos estão casados, ou juntos, mas porque os dois são seus pais, naturais ou adoptivos. Mas, se o menor tiver dois pais, ou duas mães, e estes se desentenderem, será razoável que o direito considere, em pé de igualdade, o verdadeiro pai e o falso pai, a verdadeira mãe e a falsa mãe?! Se, portanto, não são, nem nunca poderão ser, iguais, a que título lhes poderá ser dado o mesmo estatuto legal?! Que legitimidade teria o juiz para favorecer o falso pai, ou a falsa mãe, em detrimento do verdadeiro progenitor? Quer isto dizer que o «pai» ou «mãe», que não é progenitor, é pai e mãe de segunda?! Ou, então, que a relação genética, onde a houver, é absolutamente irrelevante em termos jurídicos?!
A co-adopção não é a solução para um problema, mas muitos problemas para onde não fazia falta nenhuma solução.
Quando duas mulheres reivindicaram, como seu filho, a mesma criança, Salomão, na sua lendária sabedoria, decidiu cortar ao meio a disputada criatura, para assim conhecer a sua verdadeira mãe. Se o parlamento, num gesto de néscia prodigalidade, der a algumas crianças a infelicidade de terem legalmente duas mães, ou dois pais, em breve vão ser necessários muitos Salomões nos tribunais portugueses.
A co-adopção, mais do que uma questão psicológica ou antropológica, é ética e jurídica. A psicologia e a antropologia são ciências descritivas, que observam as tendências sociais dominantes, mas a ética e o direito são saberes normativos, ou seja, estabelecem os valores e princípios por que se deve reger a vida social.
O que agora está em causa é o reconhecimento social e jurídico de uma filiação não-natural que, de algum modo, viria a consagrar as uniões de pessoas do mesmo sexo ao nível das dos casais naturais. Em termos estritamente conjugais, essa equiparação já existe na lei, desde que se permitiu o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Mas não no que respeita à filiação, porque o parceiro do progenitor não pode co-adoptar, nem duas pessoas do mesmo sexo podem ser adoptantes.
Paradoxalmente, os defensores desta reforma legislativa afirmam, por um lado, a necessidade da criança, filha de um progenitor unido a uma outra pessoa do mesmo sexo, poder ser por esta co-adoptada. Mas, por outro, dizem que, de facto, já há menores que vivem com a mãe, ou com o pai, e o respectivo companheiro do mesmo sexo, numa situação da mais absoluta normalidade e felicidade. Ou seja, querem solucionar um problema que, na prática, reconhecem não existir. Se assim é, porque pretendem então alterar o estatuto legal do parceiro do progenitor se, mesmo sem ser legalmente segundo pai, ou segunda mãe, já pode proporcionar e, segundo eles, de facto proporciona, um tão efectivo bem-estar ao menor?! Ao que parece, a criança é apenas um pretexto para uma conquista ideológica que, na realidade, interessa mais aos ditos companheiros dos pais, do que aos filhos destes.
Dir-se-á que, se o parceiro da mãe, ou do pai, for também reconhecido legalmente como segunda mãe, ou pai, terá responsabilidades parentais que beneficiarão o menor em causa. Mas, para ir buscar uma criança à escola, ou para, na ausência de um progenitor, tomar alguma decisão urgente em relação à sua saúde, não é preciso dar-lhe o estatuto de pai, ou de mãe, que, obviamente, seria falso e, até, potenciador de futuros conflitos familiares.
Com efeito, se já é problemática a regulação do poder paternal em casais desavindos, como será entre um progenitor verdadeiro e o seu duplo?! Uma mãe, ou pai, tem alguns direitos em relação a um seu filho, não por força da sua relação com o pai, ou mãe, mas em virtude da sua própria, pessoal e intransferível parentalidade. Que direito assistiria ao ex-parceiro do pai, ou da mãe, se não fosse progenitor?! O filho tem direitos e deveres em relação aos seus pais, não porque ambos estão casados, ou juntos, mas porque os dois são seus pais, naturais ou adoptivos. Mas, se o menor tiver dois pais, ou duas mães, e estes se desentenderem, será razoável que o direito considere, em pé de igualdade, o verdadeiro pai e o falso pai, a verdadeira mãe e a falsa mãe?! Se, portanto, não são, nem nunca poderão ser, iguais, a que título lhes poderá ser dado o mesmo estatuto legal?! Que legitimidade teria o juiz para favorecer o falso pai, ou a falsa mãe, em detrimento do verdadeiro progenitor? Quer isto dizer que o «pai» ou «mãe», que não é progenitor, é pai e mãe de segunda?! Ou, então, que a relação genética, onde a houver, é absolutamente irrelevante em termos jurídicos?!
A co-adopção não é a solução para um problema, mas muitos problemas para onde não fazia falta nenhuma solução.
Quando duas mulheres reivindicaram, como seu filho, a mesma criança, Salomão, na sua lendária sabedoria, decidiu cortar ao meio a disputada criatura, para assim conhecer a sua verdadeira mãe. Se o parlamento, num gesto de néscia prodigalidade, der a algumas crianças a infelicidade de terem legalmente duas mães, ou dois pais, em breve vão ser necessários muitos Salomões nos tribunais portugueses.
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