A demissão de Gaspar

Sol, 25 de Março, 2013  José António Saraiva

Crescem as vozes que pedem a demissão do ministro das Finanças.
A oposição ataca-o, dizendo que erra todas as previsões.
Alberto João Jardim reclama a sua saída, porque Gaspar não lhe dá o que ele pede.
O CDS critica-o porque, entre outras coisas, ele disputa a Portas o lugar de número dois do Governo.
Os próprios ministros não o vêem com bons olhos, porque queriam mais verbas para os seus ministérios.
E até um general (Loureiro dos Santos) veio pedir a sua cabeça, não percebi bem porquê.
Vamos por partes.Quanto ao falhanço das previsões, isso não é evidentemente argumento: não me lembro de, nos últimos 10 anos, uma única previsão de um ministro das Finanças (ou mesmo de entidades internacionais) ter batido certo.
Houve falhanços clamorosos, défices que foram 5 vezes maiores do que o previsto, e nenhum ministro foi afastado por isso.
Recorde-se que o Banco de Portugal ainda reviu várias vezes em alta os défices apresentados por diversos Governos.
E Vítor Gaspar tem a seu favor o facto de a envolvente internacional estar em constante mutação, introduzindo todas as semanas novos dados.
O problema não é, portanto, o falhanço das previsões.
A oposição pretende a demissão do ministro das Finanças porque isso constituiria um rude golpe para o Governo, cuja imagem ficaria consideravelmente enfraquecida.
O CDS também não se importaria que ele saísse porque isso reforçaria a influência de Paulo Portas.
Alberto João Jardim gostaria obviamente de não ter pela frente um ministro que diz monocordicamente: «Não há verba».
E os ministros a mesma coisa porque já perceberam que, com Gaspar nas Finanças, não têm grande margem de manobra para o reforço de verbas dos respectivos ministérios.
Mas se a saída de Vítor Gaspar seria sem dúvida um enorme rombo na imagem e na própria autoridade do Governo, o que mudaria do ponto de vista financeiro?
Financeiramente, talvez o próximo ministro das Finanças fosse menos rígido e abrisse mais os cordões à bolsa – quer em relação às exigências da Madeira, quer às pressões do CDS, quer às solicitações dos ministros.
Mas isso seria bom?
Um ministro das Finanças deve ser permissivo?
Ou, pelo contrário, deve ser firme?
A verdade é que, em toda a parte do mundo, os ministros das Finanças são os governantes mais odiados dentro e fora do Executivo.
Se eles caíssem por via da falta de popularidade, mudavam todos meses.
Já vimos este filme com Ernâni Lopes, com Ferreira Leite, ou, mais longinquamente, com Salazar, quando tinha só a pasta das Finanças.
Um ministro das Finanças ser mal-amado não é um mau sinal – é um bom sinal.
Se as contas assim já saem furadas, imagine-se o que aconteceria com um ministro das Finanças permissivo perante Jardim, perante o CDS, perante os ministros.
Era o fim.
Mas há outro aspecto.A mudança de ministro das Finanças seria muito mal vista lá fora.
Vítor Gaspar tem a confiança do Eurogrupo – que, no fim da semana passada, suavizou as condições de Portugal quanto ao pagamento dos juros da dívida; e tem a confiança da troika – que tem feito repetidos elogios ao ministro e aligeirou o cumprimento do défice e os cortes no Estado.
A saída de Gaspar criaria assim, nas instituições internacionais, uma dúvida legítima: por que razão eles tiraram um ministro competente e exigente?
Ficaria imediatamente a suspeita de Portugal querer voltar ao facilitismo, querer começar a não honrar os seus compromissos, querer deixar de cumprir as metas.
E nos mercados surgiria a mesma desconfiança – com as nefastas consequências que se conhecem.
A saída de Gaspar não teria, pois, qualquer vantagem no plano interno e seria péssima para o país no plano externo.
No plano interno, a única consequência que poderia ter era aumentar a despesa, com o aparecimento de novos buracos nas contas.
No plano externo, afectaria seriamente a imagem de Portugal.
Alguém saberá explicar, então, qual seria o benefício da saída de Vítor Gaspar?
P.S. – Para lá do ministro das Finanças, há quem advogue mesmo a demissão do primeiro-ministro. Parecem não ver o que se passa à volta – em Espanha, em Itália, na Grécia, em Chipre e até em França. Estes países têm Governos de diferentes cores, mas os problemas são os mesmos… ou piores. De que nos valeria, então, mudar de Governo? Se houvesse uma solução mágica para os países da Europa do Sul, alguém já a teria encontrado.

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