Sábado Santo: vivendo no limiar
29 de Março de 2013 Bruce Epperly
Sábado Santo é um dia em que nada acontece, nada é garantido e nada se espera. É o dia em que Jesus está morto no túmulo, é um dia enquadrado pela angústia de Sexta-Feira Santa e a celebração da Páscoa. Sábado Santo é um dia entre, um tempo entre o desespero e a esperança quer para os primeiros discípulos de Jesus quer para nós.
É claro que nenhum dos discípulos de Jesus esperava a ressurreição. Talvez imaginassem uma restauração divina no fim da história, mas não no meio do tempo. Jesus estava morto e teriam que esperar a revelação do Reino de Deus para o encontrarem outra vez. Sábado Santo é o abismo: é a experiência da negação, se o nada pode ser experimentado, o abismo sem imagens do não conhecer, o vale de lágrimas sem esperança de cura.
No Sábado Santo não há garantias de que a vida será melhor, que a doença será curadas, que a criança perdida volte a casa, que a esperança regresse e que Deus seja real outra vez. Nós precisamos de um milagre – uma ressurreição – mas não podemos forçá-la, garanti-la ou assumi-la. A ressurreição acontece, como apaixonar-se ou aliviar o luto, quando menos se espera ou quando se acha que o amor passou ao largo. Mas quando acontece, descobrimos que a nossa taça está cheia mesmo que tenhamos ainda que pernoitar no vale das sombras.
É isto que quer dizer viver num tempo limiar, no deserto sem bússola, mapa ou caminho.
Sem Sexta-feira Santa, a Páscoa torna-se superficial e predizível. Embora seja difícil, devemos procurar colocarmo-nos no lugar dos primeiros discípulos de Jesus. Devemos chegar à Páscoa sem esperança ou, ao menos, agnósticos acerca da divina providência e da sua possibilidade de mudar as nossas vidas. O Sábado Santo é um testemunho de esperança e um convite a persistir – tal como o apóstolo Tomé – apesar de todas as dúvidas. Ao fim e ao cabo, Tomé é um herói da fé: ele foi o único entre os primeiros seguidores que falhou a ressurreição. Quando regressou à companhia dos amigos ouviu histórias fantasiosas sobre a ressurreição; mas o Cristo vivo não lhe apareceu. Agnosticismo era a resposta apropriada; mas Tomé faz uma coisa espantosa, fica com os extáticos seguidores de Jesus, embora não seja capaz de partilhar a sua alegria. Ele viveu no abismo do agnosticismo, esperando contra a esperança um encontro com Jesus. Quando Jesus apareceu, Tomé transforma-se. Ele torna-se o apóstolo peregrino, cuja fé o leva à Índia onde transmitiu a boa nova a sacerdotes hindus e monges budistas. Talvez, só quem tivesse passado pela experiência psicológica e espiritual de Sábado Santo pudesse lidar com a complexidade das tradições de fé da Índia.
Abraçar o Sábado Santo é um acto de fé. Na espiritualidade liminar, confiamos em Deus apesar do silêncio, da incerteza, da oração não respondida, do falhanço, do envelhecimento e da morte. Acreditamos que há uma Presença subtil em acção – semelhante à germinação das sementes na terra negra – apesar da nossa incapacidade de O experimentarmos. O Sábado Santo lembra-nos que a jornada da fé envolve momentos de alegria e de intimidade e também momentos de ausência aparente e silêncio. A ressurreição é a nossa esperança, agora, mesmo quando não a podemos esperar ou quando não conseguimos imaginar de que modo Deus triunfará assegurando que podemos responder à nossa debilidade. No suspense do liminar, esperamos poder fazer a experiência de Deus outra vez e com ela, a coragem de sermos seus cooperadores na salvação do mundo
(tradução e adaptação de Pedro Aguiar Pinto)
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