Inconsciência

DESTAK | 07 | 04 | 2010   22.03H

João César das Neves | naohaalmocosgratis@fcee.ucp.pt

«Duzentos e cinquenta mil católicos não acreditam na vida eterna». No passado domingo, Domingo de Páscoa, o Diário de Notícias fez disto primeira página.
Segundo um estudo, 25% dos inquiridos não acreditam na ressurreição após a morte, 10% dos quais dizem ir à missa habitualmente. Cometendo um abuso estatístico comum, esses valores foram multiplicados pela população nacional para dar o título bombástico.
A confusão numérica é fácil de destrinçar. Não são 10% dos praticantes que não acreditam, mas 10% dos que não acreditam dizem ir à missa. Por outro lado, não se quis reparar que a esmagadora maioria dos portugueses (75%) acredita na ressurreição, a maior parte deles sem sequer praticar religião.
O mais curioso é não se terem notado as enormes consequências políticas e sociais da questão. Porque acreditar na ressurreição não é aspecto menor, mas decisivo na vida comunitária. Como disse há 1900 anos o primeiro filósofo cristão, S. Justino Mártir: «Se a morte terminasse na inconsciência, seria uma boa sorte para todos os malvados» (I Apologia, 18).
Acreditar que na morte acaba tudo, que não existe justiça certa e que o que se faz fica esquecido, tem enormes consequências na vida pessoal e social concreta. Pode-se ser bom assim, mas essa costuma ser a crença cómoda dos que seguem os seus caprichos.
Os terríveis abusos do nosso tempo, corrupção, falta de honra e crise de valores, que todos os quadrantes denunciam, têm certamente a ver com isto. Por cá as coisas só não são piores porque felizmente três quartos dos portugueses acreditam na ressurreição.

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