O que eles inventam
ALBERTO GONÇALVES
DN 2015.03.29
À medida que cai o segredo de justiça, começa a tornar-se pública a injustiça que fizeram a José Sócrates. Há dias, alguns media sem princípios divulgaram, excitadíssimos, pedaços das "escutas" telefónicas ao ex-primeiro-ministro. O objectivo, presume-se, era o de confirmar a culpa deste nas trapalhadas de que é suspeito. No máximo, sugeriram involuntariamente a respectiva inocência. Passemos aos factos.
As conversas em causa incluem o que se presume ser uma série de nomes de código para a palavra "dinheiro", o dinheiro de José Sócrates que José Sócrates requisitava com regularidade ao amigo de infância Carlos Santos Silva, alegadamente a ama-seca das verbas. Dado que a má vontade impera, ninguém no Ministério Público colocou a possibilidade de o código não existir e os termos utilizados serem referências literais.
Quando por exemplo José pede a Carlos para "trazer um bocadinho daquela coisa que gosto muito" há que admitir que, à altura, Carlos se encontrasse em Tentúgal e a encomenda em questão se limitar a meia dúzia de pastéis. Ou, para não sairmos da região Centro, Carlos andaria pela Bairrada e tudo se resumiria a duas sandes de leitão. Se também me escutar os telefonemas, o MP sabe as vezes que isso já me aconteceu.
Quando José pede a Carlos os "livros do Duda", é para mim claro tratar-se de uma alusão às obras do prestigiado ensaísta Eduardo Lourenço, outro amigo do antigo governante, visita pontual do presídio de Évora e um académico conhecido por procurar em vão a identidade nacional e terminar cada frase com a pergunta "Não é?" Só por sorte nunca liguei a solicitar nada de semelhante.
E quanto às "fotocópias", "documentos" e "dossiers" que José encarrega Carlos de providenciar, é obrigatório deduzir que constituem petit noms para o vil metal? É assim tão estranho que um político de carreira e um erudito da Sorbonne se rodeie em permanência de papelada solene e sortida? Alguém acredita nisto?
DN 2015.03.29
À medida que cai o segredo de justiça, começa a tornar-se pública a injustiça que fizeram a José Sócrates. Há dias, alguns media sem princípios divulgaram, excitadíssimos, pedaços das "escutas" telefónicas ao ex-primeiro-ministro. O objectivo, presume-se, era o de confirmar a culpa deste nas trapalhadas de que é suspeito. No máximo, sugeriram involuntariamente a respectiva inocência. Passemos aos factos.
As conversas em causa incluem o que se presume ser uma série de nomes de código para a palavra "dinheiro", o dinheiro de José Sócrates que José Sócrates requisitava com regularidade ao amigo de infância Carlos Santos Silva, alegadamente a ama-seca das verbas. Dado que a má vontade impera, ninguém no Ministério Público colocou a possibilidade de o código não existir e os termos utilizados serem referências literais.
Quando por exemplo José pede a Carlos para "trazer um bocadinho daquela coisa que gosto muito" há que admitir que, à altura, Carlos se encontrasse em Tentúgal e a encomenda em questão se limitar a meia dúzia de pastéis. Ou, para não sairmos da região Centro, Carlos andaria pela Bairrada e tudo se resumiria a duas sandes de leitão. Se também me escutar os telefonemas, o MP sabe as vezes que isso já me aconteceu.
Quando José pede a Carlos os "livros do Duda", é para mim claro tratar-se de uma alusão às obras do prestigiado ensaísta Eduardo Lourenço, outro amigo do antigo governante, visita pontual do presídio de Évora e um académico conhecido por procurar em vão a identidade nacional e terminar cada frase com a pergunta "Não é?" Só por sorte nunca liguei a solicitar nada de semelhante.
E quanto às "fotocópias", "documentos" e "dossiers" que José encarrega Carlos de providenciar, é obrigatório deduzir que constituem petit noms para o vil metal? É assim tão estranho que um político de carreira e um erudito da Sorbonne se rodeie em permanência de papelada solene e sortida? Alguém acredita nisto?
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