Só há responsabilidade onde há liberdade
Público 2011-12-27 Rodrigo Queiroz e Melo
O Ministério da Educação colocou em consulta pública uma proposta de revisão da estrutura curricular do ensino básico e secundário para entrar em vigor já no próximo ano lectivo, mas anunciou que se trata de um primeiro passo de uma reforma mais profunda que tem ainda de ser estudada e preparada. Os desafios estritamente pedagógicos que se colocam a esta estrutura são muitos e eminentemente técnicos. Mas há duas questões estruturais que têm de ser tratadas e que estão a montante da discussão técnica: o financiamento e a autonomia da estrutura curricular.
Não vale a pena fingir que as opções são neutras do ponto de vista financeiro. No contexto da crise que vivemos, esta questão é inultrapassável. Sendo o maior custo de uma escola os salários dos docentes, a única forma de reduzir substancialmente os custos do sistema é diminuir o número de horas curriculares. Nesta matéria, a discussão importante é saber qual a fatia do Orçamento do Estado que deve ser atribuído à educação. Reduzir o debate ao "fazer mais com menos" é simplista e enganador. Este ano, chega ao 10.º ano de escolaridade o primeiro grupo de alunos que estão abrangidos pela escolaridade obrigatória de 12 anos. Sabendo nós que apenas cerca de 50% dos alunos que terminam o 9.º ano concluem depois o 12.º, o aumento da escolaridade obrigatória implica a duplicação da oferta de ensino secundário, com o consequente aumento substancial dos custos com este nível de ensino. Não há volta a dar. Os mega-agrupamentos, a fusão de serviços do ministério, a diminuição do apoio às famílias no ensino privado não chega para fazer face a esta nova pressão no sistema. Mas a discussão é espúria. Portugal aceitou o memorando da troika que prevê a diminuição de custos na educação e o Orçamento do Estado 2012 está aprovado. Questão arrumada.
A segunda questão fundamental é a da autonomia das escolas. Portugal teve um aumento brutal do número de alunos que passaram a frequentar a escola. A taxa de abandono no ensino básico diminuiu drasticamente e a taxa de saída precoce também. Isto significa que hoje todas as crianças e jovens estão na escola. Na escola do passado, apenas tinham lugar alguns. Por outro lado, a sociedade mudou muito. A economia deixou de depender do trabalho para depender do conhecimento; a capacidade de repetir com correção uma tarefa deu lugar à necessidade de realizar novas tarefas. Daqui resultam duas tensões novas para a escola.
Por um lado, os alunos são mais diferentes uns dos outros do que eram. Na mesma turma convivem alunos com e sem apoio familiar; alunos que têm livros e computadores em casa e alunos que não têm casa. Mas a escola tem de dar resposta a todos.
Por outro lado, há uma alteração dos saberes e competências que a escola deve transmitir e promover. Aprendizagem ao longo da vida, aprender a aprender, new millenium learners, não são teorias e conceitos inventados em Portugal. Resultam de pensamento e investigação internacionais promovidos pela União Europeia, OCDE, UNESCO e outros organismos insuspeitos.
A heterogeneidade dos alunos e os novos desafios curriculares que se colocam às escolas não permitem manter a lógica de um currículo único para todos os alunos, todas as turmas e todas as escolas. Mais uma hora ou menos uma hora disto ou daquilo não resolve os problemas, nem prepara para os desafios.
Temos aqui uma janela de oportunidade: as restrições financeiras obrigam a reduzir a estrutura curricular e o Governo deu provas de que procura um core curriculum. Então, é chegado o momento de deixar amplos espaços de deliberação curricular para as escolas. Definir um número mínimo de horas de algumas disciplinas nucleares a que todos os alunos têm direito e deixar que cada escola defina o mais. Criar na escola o ambiente de inovação e procura da melhoria que vivemos na sociedade. Esta autonomia é a única forma de as escolas poderem responder aos desafios que se lhes colocam. Temos 1.500.000 desafios pela frente; um por cada aluno. Vale a pena confiar nas escolas e nos seus profissionais. Só há responsabilidade onde há liberdade.
Não vale a pena fingir que as opções são neutras do ponto de vista financeiro. No contexto da crise que vivemos, esta questão é inultrapassável. Sendo o maior custo de uma escola os salários dos docentes, a única forma de reduzir substancialmente os custos do sistema é diminuir o número de horas curriculares. Nesta matéria, a discussão importante é saber qual a fatia do Orçamento do Estado que deve ser atribuído à educação. Reduzir o debate ao "fazer mais com menos" é simplista e enganador. Este ano, chega ao 10.º ano de escolaridade o primeiro grupo de alunos que estão abrangidos pela escolaridade obrigatória de 12 anos. Sabendo nós que apenas cerca de 50% dos alunos que terminam o 9.º ano concluem depois o 12.º, o aumento da escolaridade obrigatória implica a duplicação da oferta de ensino secundário, com o consequente aumento substancial dos custos com este nível de ensino. Não há volta a dar. Os mega-agrupamentos, a fusão de serviços do ministério, a diminuição do apoio às famílias no ensino privado não chega para fazer face a esta nova pressão no sistema. Mas a discussão é espúria. Portugal aceitou o memorando da troika que prevê a diminuição de custos na educação e o Orçamento do Estado 2012 está aprovado. Questão arrumada.
A segunda questão fundamental é a da autonomia das escolas. Portugal teve um aumento brutal do número de alunos que passaram a frequentar a escola. A taxa de abandono no ensino básico diminuiu drasticamente e a taxa de saída precoce também. Isto significa que hoje todas as crianças e jovens estão na escola. Na escola do passado, apenas tinham lugar alguns. Por outro lado, a sociedade mudou muito. A economia deixou de depender do trabalho para depender do conhecimento; a capacidade de repetir com correção uma tarefa deu lugar à necessidade de realizar novas tarefas. Daqui resultam duas tensões novas para a escola.
Por um lado, os alunos são mais diferentes uns dos outros do que eram. Na mesma turma convivem alunos com e sem apoio familiar; alunos que têm livros e computadores em casa e alunos que não têm casa. Mas a escola tem de dar resposta a todos.
Por outro lado, há uma alteração dos saberes e competências que a escola deve transmitir e promover. Aprendizagem ao longo da vida, aprender a aprender, new millenium learners, não são teorias e conceitos inventados em Portugal. Resultam de pensamento e investigação internacionais promovidos pela União Europeia, OCDE, UNESCO e outros organismos insuspeitos.
A heterogeneidade dos alunos e os novos desafios curriculares que se colocam às escolas não permitem manter a lógica de um currículo único para todos os alunos, todas as turmas e todas as escolas. Mais uma hora ou menos uma hora disto ou daquilo não resolve os problemas, nem prepara para os desafios.
Temos aqui uma janela de oportunidade: as restrições financeiras obrigam a reduzir a estrutura curricular e o Governo deu provas de que procura um core curriculum. Então, é chegado o momento de deixar amplos espaços de deliberação curricular para as escolas. Definir um número mínimo de horas de algumas disciplinas nucleares a que todos os alunos têm direito e deixar que cada escola defina o mais. Criar na escola o ambiente de inovação e procura da melhoria que vivemos na sociedade. Esta autonomia é a única forma de as escolas poderem responder aos desafios que se lhes colocam. Temos 1.500.000 desafios pela frente; um por cada aluno. Vale a pena confiar nas escolas e nos seus profissionais. Só há responsabilidade onde há liberdade.
Comentários