Passa-se o seguinte

Público 2011-05-20  Miguel Esteves Cardoso

Numa coisa seremos sempre ricos: na quantidade de dinheiro que achamos que é mal gasta. Nunca nos passa pela cabeça que esse dinheiro talvez não exista. Não. Existe. E é bastante. O Estado português tem essa capacidade de despesa. Só que nunca gasta como deveria essa fortuna que sempre nos acompanha. Vemos Portugal como um milionário perdulário. Tanto no que não aproveita (este povo, este clima, este potencial) como no que esbanja. Vem dar ao mesmo. A constante é que Portugal é rico mas gasta mal o dinheiro, seja por corrupção, ignorância, megalomania, interesses obscuros, estupidez ou excesso de confiança no futuro ou no passado.
Esta fé no nosso monte de massa exprime-se pela seguinte fórmula de crítica política, popular ou profissional:
"Em vez de gastar dinheiro com [inserir despesas públicas que se acham desnecessárias, seja o TGV ou o SNS, tanto faz], Portugal deveria era investir nas [inserir despesas públicas que se preferem, como o bem-estar do povo ou a educação]".
O objectivo não é poupar ou ganhar dinheiro - é redistribuir o dinheiro que já temos, sabemos lá como, de uma maneira mais justa, inteligente e favorável à causa de cada um. Assim, sabendo empregá-lo, contornamos o facto desse dinheiro não existir.
E vamos-nos distraindo e defendendo, pensando que o problema é não sabermos gastar melhor o dinheiro que não só não temos mas somos, cada vez mais, obrigados a comprar por um preço que não somos capazes de pagar.



Comentários

RC disse…
Hayek poderia acresecentar à sua teoria este exemplo português. A teoria económica estabelece que não é possível distribuir a riqueza que não se criou. Hayek corrige que certas políticas de distribuição impedem a criação de riqueza. Que pena ser desconhecida esta verdade nas nossas faculdades de Economia! Portugal vai mais longe pois distribui como se fosse riqueza aquilo que nunca criou. Nem sei onde encaixar esta nossa singularidade...

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