Moderem o pretensês

Público 20110216 Miguel Esteves Cardoso

Nas auto-estradas vem o aviso: "Com chuva/Modere velocidade". Por que é que estes sinais não conseguem falar português? Português é a língua como se fala ou como se escreve, quando se quer ser entendido.
Qual é a passageira do banco da frente que diz, caso estejamos a andar depressa de mais: "Com chuva, modere velocidade". Nem um robô japonês falaria assim.
Dirão que é uma questão de caracteres. Mentira. "Com chuva modere velocidade" tem 27 caracteres. "Se chover, vá mais devagar" tem 26, com vírgula. "Calma, que está a chover" ainda tem menos. O mal destes sinais não é o analfabetismo: as pessoas que os escrevem até sabem ler. É a pretensão de falar bem. Não é português - é pretensês.
O verbo "moderar", para estas bestas, é fino e distingue-as do maralhal. Tanto faz ser-se moderador da velocidade como de um debate: incitam-nos a sermos "pivôs" numa discussão entre várias velocidades excessivas.
Porque é que "Modere velocidade" (17 caracteres) perdeu o artigo intermédio "a"? Porque ocupa muito espaço. Comparado, por exemplo, com "Vá mais devagar" (15 caracteres). "Modere velocidade" é mais um conselho de carreira profissional (vá para jornalista de debates sobre corridas de automóveis) ou um lema latino muito mal transcrito, significando "a moda é fugaz".
Português não é. Como aliás todo o português público não é. "Circule com precaução" admite-se numa rotunda (mesmo não sendo tal coisa). Mas é raro o automobilista que só circule.

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