Profecias políticas
08.06.2008, Vasco Pulido Valente
Quando toda a gente especula sobre o futuro de Portugal e o do mundo, um historiador não resiste a pensar na ideia deformada e abstrusa que os contemporâneos normalmente têm de si próprios. Basta ver o que se acreditou e o que se escreveu entre o advento de Hitler e o fim da II Guerra Mundial. A Alemanha parecia a Potência dominante e o medo da Alemanha inspirou uma política geral de apaziguamento. Mas, de facto, essa ideia assentava numa circunstância efémera e precária: o afastamento da América e da URSS da cena europeia. A Alemanha não passava de uma Potência de 2.ª classe, capaz de bater uma Potência de 3.ª classe - a França semi-industrializada e pobre - e uma dúzia de pequenos países; incapaz de bater o Império Britânico, excepto se o Império Britânico por inadvertência ou erro se entregasse, ou a URSS, excepto se o Partido Comunista se desfizesse (como Hitler, aliás, contava) com a facilidade com que se desfizera a monarquia de Nicolau II.
Com mais realismo, os franceses conheciam a sua própria fraqueza. Infelizmente nem Churchill nem Estaline a perceberam a tempo. Um e outro julgavam que os franceses podiam resistir a Hitler com a dureza e a persistência de 1914-1918. Churchill queria que a Inglaterra viesse ainda a combater no continente (nos Balcãs, por exemplo). E Estaline, quando assinou o Pacto Germano--Soviético em 1939, esperava que a Alemanha e as democracias se destruíssem entre si e o deixassem senhor do Ocidente. O colapso de 1940 só não surpreendeu a França, e mesmo desse colapso a França tirou a extraordinária conclusão de que, para usar uma frase famosa, a Alemanha iria estrangular a Inglaterra "como uma galinha".
E a loucura não ficou por aqui. Hitler declarou espontaneamente guerra à América, porque sobrestimava (para lá da mais furiosa fantasia) a capacidade militar do Japão e supunha que a América se esgotaria no Pacífico. Pior ainda: Mussolini achava a Itália uma Potência militar de 1.ª classe, falava como se fosse Augusto e planeava restabelecer o Império Romano do século I, expulsando do Mediterrâneo a Inglaterra, a França, a Espanha e a Turquia. Até os pequenos países não escaparam à megalomania universal. A Polónia insistiu em se defender sem ajuda ou, pelo menos, sem ajuda russa, a única disponível. E a Hungria, com Hitler à porta, sonhava com a hegemonia da Europa central. A profecia política não se recomenda.
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