Made in USA

João Carlos Espada, Expresso, 080614
jcespada@netcabo.pt

Há duzentos anos que os revolucionários da esquerda e os reaccionários da direita andam a contar lendas contra a América. E há duzentos anos que a vibrante democracia americana simplesmente as ignora
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A 2 de Fevereiro, após a chamada ‘super terça-feira’, escrevi neste espaço que “a democracia americana volta a proporcionar-nos um excitante combate político”. Repito hoje o que disse nessa altura, e faço-o por maioria de razão: os dois candidatos agora em confronto são do melhor que a democracia nos pode dar.
O candidato republicano, John McCain, era dado como falido e acabado há apenas seis meses. Partidariamente, é um ‘maverick’, um político que pensa por si e diz o que pensa. Defendeu a intervenção no Iraque e continua a defendê-la. Condenou o utopismo visionário de Rumsfeld, acusando-o de querer vencer uma guerra com tecnologia e sem soldados. Há muito tempo defende a «surge», que está finalmente a dar resultado no Iraque. Quando lhe dizem que a defesa da guerra no Iraque não rende votos, responde que prefere perder as eleições a perder a guerra.
Em política doméstica, não é menos surpreendente. Contra a ortodoxia republicana, subscreveu uma espécie de amnistia para os imigrantes ilegais; condenou a tortura aos suspeitos de terrorismo; defende reformas no financiamento dos partidos; e, sendo embora um acérrimo defensor do mercado e da empresa livres, preconiza uma ética de serviço público e a dignificação da actividade política.
O equivalente a McCain no partido democrático é Barack Obama. É senador há apenas três anos. Cita Ronald Reagan como um líder que refez a cultura política, apresentando-se como o candidato que hoje pode fazer o mesmo a partir da esquerda. Reúne apoios da contracultura dos anos 60 e da nova geração do YouTube. Dispõe de muito dinheiro, oriundo sobretudo de pequenos donativos. E conseguiu a proeza de derrotar a candidata que ao longo do último ano era dada como certa pelos democratas: Hillary Clinton.
Além de tudo isto, Barak Obama rompe com a cultura de vitimização dos negros americanos: raramente refere a questão racial. Por outras palavras, ele não é um candidato negro; é um candidato que por acaso é negro. Este é mais um saudável contraste com a sra. Clinton que, sobretudo no final da campanha, passou o tempo a dizer que era mulher.
Recordo que, há oito anos, apoiei nestas páginas a candidatura de John McCain, então derrotado por George W. Bush. Continua hoje a ser o meu favorito, embora o resultado seja neste momento imprevisível. Mas o ponto realmente interessante é que a democracia americana volta a refutar as lendas que pretendem descrevê-la como uma oligarquia do chamado “complexo militar-industrial”. Há duzentos anos que os revolucionários da esquerda e os reaccionários da direita andam a contar essas lendas. E há duzentos anos que a vibrante democracia americana simplesmente as ignora.

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