Um gene para a crueldade e para o altruísmo humano, DN, 080409
Um gene para a crueldade e para o altruísmo humano
LUÍS NAVES
Receptores de vasopressina em causa
Os comportamentos tirânicos podem estar ligados à genética das pessoas, segundo sugere um estudo conduzido por uma equipa israelita liderada por Richard Ebstein, da Uni- versidade Hebraica de Jerusalém. Os cientistas dizem que a investigação foi a primeira a mostrar que há genes, existentes noutros mamíferos, que estão relacionados, nos humanos, com decisões sobre comportamentos de altruísmo ou do seu inverso, o egoísmo.A ideia de existir um "gene da crueldade" promete conduzir a novas perspectivas sobre os mecanismos da evolução, embora também haja uma crítica ligada ao método. O estudo da equipa de Ebstein, publicado na revista científica Genes, Brain and Behavior, baseia-se num jogo económico, chamado Jogo dos Ditadores, onde se verificam fortes diferenças de comportamento entre os jogadores, que geram interpretações (nem sempre coincidentes) das razões para tais comportamentos.No Jogo dos Ditadores, um grupo relativamente limitado comporta-se de forma totalmente egoísta. Um grupo menor faz o inverso. Nesta investigação, foram analisadas as reacções de 203 estudantes universitários, divididos entre "ditadores" e "receptores".Ora, quase 18% do primeiro grupo guardava todo o dinheiro e apenas 6% eram suficientemente generosos para oferecerem tudo ao receptor. Faltava dar o passo seguinte: tentar perceber as variações genéticas dos participantes. E, aqui, havia um bom suspeito.A ideia de Ebstein e da sua equipa foi a de investigar o gene AVPR1, porque este produz receptores que detectam uma hormona, a vasopressina, que se sabe estar ligada ao altruísmo e a outros comportamentos sociais, nomeadamente a afectividade.Depois de identificarem as pessoas menos generosas, através do jogo dos ditadores, os investigadores olharam para o AVPR1 dos sujeitos e a respectiva vasopressina. Foram também estudados os progenitores dos jogadores. Feitas as contas: o comportamento mais cruel estava ligado a indivíduos onde o gene AVPR1 surgia numa versão mais curta. Verificou-se também a correlação inversa: as pessoas mais altruístas parecem ter um gene mais comprido.Não existe ligação aparente entre o comportamento egoísta no Jogo dos Ditadores e o sexo dos jogadores, mas o mecanismo envolvido nas acções generosas não é claro. Ebstein supõe que a distribuição dos receptores de vasopressina possa ter aqui um papel, dando à pessoa maior ou menor compensação por uma acção de generosidade.Esta investigação pode vir a ter implicações na forma de avaliar a "crueldade" humana e o seu oposto, a generosidade. A genética, apesar de tudo, não poderá explicar casos extremos de tiranias, os comportamentos que nos habituámos a classificar de "desumanos". Há quem lembre que as ditaduras têm complexos contextos sociais e políticos e que os mecanismos genéticos podem influenciar certas acções, mas nunca explicam o conjunto.Outra crítica tem a ver com a interpretação das acções dos jogadores. O comportamento no Jogo dos Ditadores nem sempre coincide com o de outros jogos económicos: pessoas que no primeiro dão alguma coisa, nos segundos agem de forma impiedosa, talvez por acharem que, no primeiro, os cientistas esperam deles um comportamento altruísta.
Receptores de vasopressina em causa
Os comportamentos tirânicos podem estar ligados à genética das pessoas, segundo sugere um estudo conduzido por uma equipa israelita liderada por Richard Ebstein, da Uni- versidade Hebraica de Jerusalém. Os cientistas dizem que a investigação foi a primeira a mostrar que há genes, existentes noutros mamíferos, que estão relacionados, nos humanos, com decisões sobre comportamentos de altruísmo ou do seu inverso, o egoísmo.A ideia de existir um "gene da crueldade" promete conduzir a novas perspectivas sobre os mecanismos da evolução, embora também haja uma crítica ligada ao método. O estudo da equipa de Ebstein, publicado na revista científica Genes, Brain and Behavior, baseia-se num jogo económico, chamado Jogo dos Ditadores, onde se verificam fortes diferenças de comportamento entre os jogadores, que geram interpretações (nem sempre coincidentes) das razões para tais comportamentos.No Jogo dos Ditadores, um grupo relativamente limitado comporta-se de forma totalmente egoísta. Um grupo menor faz o inverso. Nesta investigação, foram analisadas as reacções de 203 estudantes universitários, divididos entre "ditadores" e "receptores".Ora, quase 18% do primeiro grupo guardava todo o dinheiro e apenas 6% eram suficientemente generosos para oferecerem tudo ao receptor. Faltava dar o passo seguinte: tentar perceber as variações genéticas dos participantes. E, aqui, havia um bom suspeito.A ideia de Ebstein e da sua equipa foi a de investigar o gene AVPR1, porque este produz receptores que detectam uma hormona, a vasopressina, que se sabe estar ligada ao altruísmo e a outros comportamentos sociais, nomeadamente a afectividade.Depois de identificarem as pessoas menos generosas, através do jogo dos ditadores, os investigadores olharam para o AVPR1 dos sujeitos e a respectiva vasopressina. Foram também estudados os progenitores dos jogadores. Feitas as contas: o comportamento mais cruel estava ligado a indivíduos onde o gene AVPR1 surgia numa versão mais curta. Verificou-se também a correlação inversa: as pessoas mais altruístas parecem ter um gene mais comprido.Não existe ligação aparente entre o comportamento egoísta no Jogo dos Ditadores e o sexo dos jogadores, mas o mecanismo envolvido nas acções generosas não é claro. Ebstein supõe que a distribuição dos receptores de vasopressina possa ter aqui um papel, dando à pessoa maior ou menor compensação por uma acção de generosidade.Esta investigação pode vir a ter implicações na forma de avaliar a "crueldade" humana e o seu oposto, a generosidade. A genética, apesar de tudo, não poderá explicar casos extremos de tiranias, os comportamentos que nos habituámos a classificar de "desumanos". Há quem lembre que as ditaduras têm complexos contextos sociais e políticos e que os mecanismos genéticos podem influenciar certas acções, mas nunca explicam o conjunto.Outra crítica tem a ver com a interpretação das acções dos jogadores. O comportamento no Jogo dos Ditadores nem sempre coincide com o de outros jogos económicos: pessoas que no primeiro dão alguma coisa, nos segundos agem de forma impiedosa, talvez por acharem que, no primeiro, os cientistas esperam deles um comportamento altruísta.
Comentários