‘Yes, he can!’

Expresso, 20080830
Miguel Monjardino
miguelmonjardino@gmail.com

Pode Obama perder as eleições? Sim, pode. As últimas sondagens revelam isso mesmo
De quatro em quatro anos, os europeus têm durante o Verão um sonho americano. Durante este agradável sonho, os americanos elegem um presidente sofisticado, intelectual, progressista, educado nas melhores universidades do país, eloquente, curioso em relação às mais recentes políticas públicas e ao que se passa no estrangeiro. Nessas abençoadas semanas, os europeus acordam optimistas em relação ao futuro do Velho e Novo Continente.
O problema é que a seguir vem o Outono. E com o Outono vem o choque e o pavor. O presidente ardentemente desejado no Velho Continente perde para um candidato conservador, anti-intelectual, céptico em relação ao papel do governo federal, adepto do mercado, retrógrado em questões sociais, religiosas e judiciais, partidário da pena de morte e apologista das virtudes do poder militar americano. Será que este ano vamos ter uma enorme desilusão europeia em Novembro?
Eu sei, eu sei. A pergunta parece completamente ridícula. Para começar, George W. Bush, é um Presidente extremamente impopular. No mês passado, apenas 33% dos americanos apoiavam a maneira como Bush estava a exercer o seu mandato. 65%, a mais alta percentagem de sempre, tinham uma opinião negativa do seu Presidente. O preço dos combustíveis é extremamente elevado, as dúvidas sobre o sistema bancário e a economia são grandes e o cepticismo em relação ao estado do país e à sua influência internacional é geral. Os republicanos são tão impopulares que em Novembro os democratas têm uma excelente hipótese de aumentar a sua maioria na Câmara dos Representantes e de conseguir entre 56 e 60 lugares no Senado. Como o senador Charles Schumer (democrata/Nova Iorque) disse na quarta-feira à noite, em Denver, Novembro é uma oportunidade única para a coligação democrata. Com os republicanos claramente do lado errado da história, a possibilidade de Barack Obama perder para John McCain é praticamente nula. Certo?
As últimas semanas mostraram que a vitória de Obama não é inevitável. Por mais que custe a muitos europeus, a verdade é que a resposta à pergunta “Será que Obama pode perder?” é “Yes, he can!” A actual eurobamania está rodeada de grandes triunfos mas também de vulnerabilidades importantes. Os triunfos estão associados a questões políticas, sociais e organizacionais. A nomeação de Barack Obama como candidato presidencial dos democratas na quarta-feira à noite, na véspera do 45º aniversário do célebre discurso de Martin Luther King “I Have a Dream”, no Lincoln Memorial em Washington, DC, foi um enorme momento político e social na história dos EUA. Há um ano, praticamente ninguém acreditava que Obama pudesse derrotar a poderosa e supostamente bem organizada campanha de Hillary Clinton. Joshua Green mostra no seu artigo ‘The Front-Runner’s Fall’ (‘Atlantic Monthly’/Setembro), como a campanha de Clinton se transformou rapidamente num caos tóxico. Uma gestão criteriosa da sua equipa, uma excelente organização, inovações ao nível do financiamento da sua campanha e uma retórica política de grande nível permitiram a Obama surpreender tudo e todos nas primárias dos democratas.
As vulnerabilidades têm a ver com as dúvidas dos americanos em relação a Obama. Para muitos europeus, o candidato presidencial dos democratas é extremamente bem conhecido e, obviamente, devia estar muito à frente nas sondagens. John McCain devia estar para lá do horizonte. Devia, mas não está. A meio da semana, praticamente todas as sondagens mostravam aquilo que para todos os efeitos é um empate entre McCain e Obama. Em termos de distribuição de votos no Colégio Eleitoral que elegerá o presidente, Obama tem uma vantagem de apenas dez votos. Peggy Noonan, uma astuta observadora da cena política americana, explica na sua coluna ‘They’re paying attention now’ (‘Wall Street Journal’, 22 de Agosto) porque é que Obama não está claramente à frente de McCain.
“É difícil para a nossa classe política recordar que Obama só é famoso na América desde o Inverno de 2008. A América encontrou-o há apenas seis meses! A classe política entrevistou-o pela primeira vez ou leu a entrevista, em 2003 ou 2004, quando ele era uma estrela em ascensão. Eles conhecem-no. Todos os outros estão ainda a prestar atenção. Isto é o que eles vêem. Um homem atraente, inteligente, interessante mas... é difícil de categorizar. É o general Obama? Não, não tem passado militar. Brilhante homem de negócios Obama? Não, nunca trabalhou em negócios. Nome famoso Obama? Não, é um nome novo, um nome pouco usual. Governador durante muitos anos no Sul? Não. É um activista e gestor comunitário (o que é isso?), depois um advogado (búuu), depois um legislador estadual (e depois?, o meu primo também é), depois senador (há menos de quatro anos!). Não há nenhuma categoria pré-existente para ele”.
Obama ainda não convenceu uma maioria clara dos americanos. Os próximos 68 dias prometem uma extraordinária campanha presidencial.
Às portas de Cabul
Nicolas Sarkozy, Gordon Brown e Condoleezza Rice manifestaram mais uma vez o empenho e a determinação dos seus governos e militares no Afeganistão. A recente emboscada aos pára-quedistas franceses mostra que um dos grandes objectivos dos talibãs e os seus aliados é pressionar Cabul e os arredores da capital. Esta situação era impensável há uns meses. As forças destes grupos não têm capacidade militar para tomar a cidade. O poder aéreo da NATO e dos EUA, os meios militares estrangeiros em Cabul são ainda demasiado fortes para os talibãs. Mesmo assim, ao mostrar que têm os meios para infligir baixas substanciais a forças militares estrangeiras relativamente perto de Cabul, os talibãs e os seus aliados levantam dúvidas em relação à logística do abastecimento à capital e semeiam o medo na população civil.

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