O poder da palavra
Público 2011-06-15
Jorge Reis-Sá
Enquanto pai, agradeço penhorado, mas não preciso de nenhum ministro da Educação. Preciso de um ministro do Ensino
Numa altura em que toda a gente se preocupa com a essência das coisas, permitam-me centrar um bocadinho o debate numa questão que pode parecer, ainda que mal, pouco essencial - o poder da palavra.
O novo Governo será apresentado dentro de poucos dias e nele estará inscrito muito daquilo que pode, ou não, salvar o país da bancarrota. Poderia, por isso, começar imediatamente a economizar palavras da mesma maneira que pensa economizar pastas ministeriais. Não se correria o risco de surpreender na tomada de posse o novo e recatado ministro dos Negócios Estrangeiros, dr. Paulo Portas, com novos "Assuntos do Mar". Ou, no caso, e citando o PÚBLICO de 10 de Junho, com "Negócios Estrangeiros, da Internacionalização e da Lusofonia". Se é dos "Negócios Estrangeiros", já pressupomos que também há-de ser da "Lusofonia" e, não fosse esse o negócio, da "Internacionalização".
O mesmo vale para o ministro da Economia, que não precisa de continuar a ser "da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento" (todos esperamos que o ministro da Economia a queira desenvolvida). Ou para a Agricultura, que também já foi do "Desenvolvimento Rural e Pescas" (se for da Agricultura e não quiser ser do Desenvolvimento Rural é porque é esquizofrénico e não serve para ministro). No tempo do dr. Santana Lopes houve até lugar a um Ministério das Cidades, da Administração Local, Habitação e Desenvolvimento Regional. Não admira que o Governo tivesse durado tão pouco - com alguém sem saber se havia de governar habitações, localidades, cidades ou regiões, só podia ter havido problemas.
Mas o caso mais substantivo é a "Educação e Ensino Superior". O poder das palavras deve ser aqui bem medido. Eu, enquanto pai, agradeço penhorado, mas não preciso de nenhum ministro da Educação. Menos ainda de um ministro da Educação e do Ensino Superior (a natureza judicativa inscrita no nome da pasta não diz muito bem do restante ensino). Preciso, isso sim, de um ministro do Ensino. É que a educação deve ser dada em casa. Na escola, eu espero que instruam, que ensinem - a ler, a contar, a escrever, e depois coisas bem mais sérias, como Geografia, História ou Biologia. A existência de um Ministério da Educação demite os próprios pais do seu maior dever. A escola serve, antes de tudo o mais, para ensinar.
Peço-vos, por isso, dr. Pedro Passos Coelho e dr. Paulo Portas, também recato e sobriedade no uso dos termos. Chega de títulos nobiliárquicos nas pastas ministeriais. Neste momento, precisamos é de alguém que faça muito, mas com poucas e bem escolhidas palavras. Escritor
Jorge Reis-Sá
Enquanto pai, agradeço penhorado, mas não preciso de nenhum ministro da Educação. Preciso de um ministro do Ensino
O novo Governo será apresentado dentro de poucos dias e nele estará inscrito muito daquilo que pode, ou não, salvar o país da bancarrota. Poderia, por isso, começar imediatamente a economizar palavras da mesma maneira que pensa economizar pastas ministeriais. Não se correria o risco de surpreender na tomada de posse o novo e recatado ministro dos Negócios Estrangeiros, dr. Paulo Portas, com novos "Assuntos do Mar". Ou, no caso, e citando o PÚBLICO de 10 de Junho, com "Negócios Estrangeiros, da Internacionalização e da Lusofonia". Se é dos "Negócios Estrangeiros", já pressupomos que também há-de ser da "Lusofonia" e, não fosse esse o negócio, da "Internacionalização".
O mesmo vale para o ministro da Economia, que não precisa de continuar a ser "da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento" (todos esperamos que o ministro da Economia a queira desenvolvida). Ou para a Agricultura, que também já foi do "Desenvolvimento Rural e Pescas" (se for da Agricultura e não quiser ser do Desenvolvimento Rural é porque é esquizofrénico e não serve para ministro). No tempo do dr. Santana Lopes houve até lugar a um Ministério das Cidades, da Administração Local, Habitação e Desenvolvimento Regional. Não admira que o Governo tivesse durado tão pouco - com alguém sem saber se havia de governar habitações, localidades, cidades ou regiões, só podia ter havido problemas.
Mas o caso mais substantivo é a "Educação e Ensino Superior". O poder das palavras deve ser aqui bem medido. Eu, enquanto pai, agradeço penhorado, mas não preciso de nenhum ministro da Educação. Menos ainda de um ministro da Educação e do Ensino Superior (a natureza judicativa inscrita no nome da pasta não diz muito bem do restante ensino). Preciso, isso sim, de um ministro do Ensino. É que a educação deve ser dada em casa. Na escola, eu espero que instruam, que ensinem - a ler, a contar, a escrever, e depois coisas bem mais sérias, como Geografia, História ou Biologia. A existência de um Ministério da Educação demite os próprios pais do seu maior dever. A escola serve, antes de tudo o mais, para ensinar.
Peço-vos, por isso, dr. Pedro Passos Coelho e dr. Paulo Portas, também recato e sobriedade no uso dos termos. Chega de títulos nobiliárquicos nas pastas ministeriais. Neste momento, precisamos é de alguém que faça muito, mas com poucas e bem escolhidas palavras. Escritor
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