O bem da má vontade
Público, 2010-11-30 Miguel Esteves Cardoso A Maria João não gosta de agriões. Odeia. Mas, de vez em quando, quando tem pena de mim, faz-me a melhor salada de agriões do mundo. Detesta lavá-los e arranjá-los. Detesta temperá-los. Mas, por obrigação, com sacrifício e perda de prazer e de tempo útil, faz-me uma salada de agriões. Eu aprecio mais a salada - dá-me mais gosto por causa disso. Também eu, não em contrapartida mas em compartida , meto-me em trabalhos por causa dela, que me custam, porque sei que ela vai gostar. O prazer de ver o outro feliz é verdadeiro e bom - mas não compensa, em termos de tempo e de energia gastas (incluindo o que não se fez por estar a fazer aquilo que não nos apeteceria, se fosse só por nós). É uma dádiva. É treta dizer-se que se cozinha com amor ou por paixão. Tudo o que eu comi de bom foi cozinhado com tédio, por dinheiro ou dever, com raiva de perder assim o tempo, por tão pequeno lucro. O acompanhamento é a exigência, vinda dos anos 60, que n