As bandeiras do povo
Pedro Afonso
Numa altura difícil como esta, mais do que nunca é preciso reflectir sobre o modelo de sociedade que se tem construído. O endividamento das famílias, a ilusão do consumo, a falta de ética por parte de gestores e administradores do sistema financeiro e de muitas empresas foram algumas das razões que conduziram ao estado actual. Neste contexto de provação qual é o primeiro apoio que tem uma pessoa em situação de dificuldade? A resposta é simples: a família. É na família que o indivíduo vai buscar apoio emocional, financeiro, consolo, ânimo e forças para recomeçar. E o que é que a classe política tem feito para proteger a família? Diria que quase nada. Utiliza-se com frequência uma retórica política abstracta, referindo que temos que ajudar as "pessoas", omitindo, porém, que quando não se ajudam as famílias também não se ajudam as pessoas.
Os ataques ao modelo tradicional de família só podem ser explicados por ignorância. Aqueles que têm procurado fragilizá-la, provavelmente nunca a conheceram verdadeiramente ou tiveram dela uma má experiência. É difícil encontrar outra explicação para as tentativas que temos assistido de desmantelamento desta estrutura elementar de qualquer sociedade. Constata-se, portanto, que o Homem inventa novos ideais organizativos da sociedade, não porque eles sejam melhores, mas porque verdadeiramente nunca alcançou a plenitude dos antigos. O aguilhão extremista que pica o legislador "progressista", e que se apresenta ardilosamente como liberdade, não é mais do que um experimentalismo anárquico. Foi o que aconteceu no passado: sempre que se fragilizou a família, destabilizou-se a sociedade.
Neste tempo confuso, o Homem deseja solidariedade, segurança e estabilidade. A família é onde a vida nasce, se desenvolve, até à plenitude da realização dos seus membros. Tudo ocorre estruturado numa lógica de solidariedade em oposição a uma lógica individualista. Mas as relações familiares vão mais longe, verificando-se um sentimento mais profundo entre os seus membros: a comunhão. A infelicidade de um dos membros é a infelicidade dos restantes, e o mesmo acontece para o sentimento inverso. Não têm pois razão, aqueles que elegem como prioridades políticas outras necessidades. Torna-se quase ultrajante para o indivíduo em dificuldades verificar que existe uma classe política que defende bandeiras políticas "progressistas", em lugar de garantir necessidades elementares e simples, reforçando o núcleo estrutural de uma sociedade (a família) uma vez que é aí que elas são garantidas.
Centrar o discurso político nas causas fracturantes acaba por ser quase cómico. Não se trata, na verdade, de uma comédia uma vez que a sua concretização adquire contornos de tragédia. Quando o momento deveria ser de compaixão, cai-se no delírio. Nada mais inoportuno. De resto, as verdadeiras bandeiras do povo estão identificadas há muito tempo e não são aquelas que agora se propagam. Estas "novas bandeiras" podem significar a sobrevivência política de alguns, mas não entusiasmam a maioria, nem sequer são as bandeiras que o mundo precisa. As duas instituições fundamentais da humanidade são a Família e o Estado. Será um erro e uma enorme injustiça fortalecer o Estado deixando enfraquecer a Família. A sociedade carece de uma intervenção política em defesa da família − liberta do individualismo subjectivista − centrada no pensamento pelo bem comum. Mais do que nunca é importante proteger, quer ao nível jurídico, quer ao nível assistencial e económico, todas as famílias que necessitem de especial apoio. O Estado deverá, por todos os meios ao seu alcance, impedir situações de exclusão, de pobreza e solidão, exigindo, porém, como contrapartida um autêntico esforço de empenho pessoal na concretização de um recomeço; o recomeço de uma nova vida. Este seria um bom ponto de partida para se combater a actual crise e uma "verdadeira bandeira do povo" a que a maioria provavelmente estaria disposta a aderir.
Pedro Afonso
Comentários
Espero que aparecam mais líderes de opinião a falarem sobre este assunto.