Chamem o gerente

Público, 20091127 Luís Campos e Cunha

A A8 não é uma auto-estrada, mas pagamos como se fosse. Porquê? Porque não avançam as obras?


Viver nos Estados Unidos ensina-nos, como realidade existencial de cada dia, que somos pessoas com direitos e que devemos exercê-los. Quando vamos a uma loja, a um restaurante ou temos de obter uma informação num serviço, se algo corre mal, podemos sempre pedir para falar com o gerente. De facto, bastou-me sempre dizer - "call the manager" - para o problema se resolver. Em Portugal acanhamo-nos, temos vergonha, engolimos sapos. Mas desde então, tenho pouca pachorra. E chamo o responsável.

Vem isto a propósito da falta de consideração com que somos tratados por entidades públicas e privadas que deviam estar ao nosso serviço -ao serviço do público- e nos tratam com falta de respeito. Os exemplos que vou dar são apenas da minha experiência (gosto de falar do que sei), mas estou certo que todos conhecemos muitos exemplos que nos tocam diariamente.

Moro em Lisboa na Praça do Areeiro que entrou em obras, aparentemente por causa do Metro. Em finais de Agosto ou primeiros dias de Setembro o Metro fechou uma saída do túnel e emparedou metade da praça ao estacionamento para fazer obras na estação, segundo dizem. Seja pelo que for, com prepotência, consentida por quem de direito, o Metro transformou a vida dos moradores num pequeno inferno à procura de lugares de estacionamento, e passados três meses as obras nem se iniciaram. Porque na altura em que o Areeiro foi construído não havia garagens, estamos sem estacionamento, mesmo para quem tem o dístico de residente da EMEL, e as obras nem se iniciaram. Este abuso e esta prepotência do Metro só revela falta de consideração pelo cidadão e pelo público que são supostos servir.

Poderão dizer que a uma centena de metros, já na Avenida do Aeroporto, há um estacionamento ao ar livre. Primeiro, é pago; segundo e mais grave, à noite é extremamente inseguro. A última vez que lá estacionei roubaram-me uma roda do carro, agora imaginem o que pode acontecer a uma senhora que tenha de chegar à meia-noite. Mais uma vez, nada foi previsto no sentido de minorar os efeitos da falta de estacionamento, melhorar a segurança dos cidadãos, e ajustar o pouco estacionamento existente à nova situação. Bem pelo contrário, nunca as autoridades foram tão zelosas a bloquear carros que, em desespero de causa, estacionam em cima dos passeios (aliás, amplos passeios).

Segundo exemplo, curiosamente sobre estacionamento. Sou um frequentador assíduo de museus e galerias, uma vez que o meu hobby é a arte contemporânea. Por isso, fui um frequentador assíduo do Museu do Chiado que, com poucos recursos, vai apresentando um programa que vale a pena ver. Mas quem o quiser visitar, num domingo por exemplo, verifica que tem uma dificuldade enorme: não consegue estacionamento. À volta do museu todo o estacionamento está reservado: é o Governo Civil, a Rádio Renascença, a Polícia, um pequeno hospital e (espanto) também pelo Museu do Chiado. Este não para os visitantes mas para a quem lá trabalha. Será que estas entidades não podem, durante o fim-de-semana, prescindir de algum espaço para que os visitantes possam confortavelmente ir ao museu? Será que a nomenclatura do Museu do Chiado não poderia prescindir dos seus direitos (não utilizados) ao domingo para que o público possa ir com mais conforto às suas exposições? Nos lugares reservados ao Governo Civil, às ambulâncias (nunca vi nenhuma) e ao Museu do Chiado nunca se vê vivalma durante os sábados à tarde e domingos; porque não ceder por esse período os lugares aos lisboetas? Apetece chamar o gerente mas nem sei quem é. É a falta de respeito por quem paga o estacionamento em Lisboa: os lisboetas.

Por último, falta falar da A8, auto-estrada que liga Lisboa a Torres Vedras. Quem a conhece sabe que está quase integralmente em obras para alargar a uma terceira faixa (já agora porquê? Se a entrada de Lisboa não pode ser alargada.) E, por isso, a circulação faz-se em faixas estreitas, perigosas e apenas a 80km/h. Ou seja, a A8 não é uma auto-estrada, mas pagamos como se fosse. Porquê? Porque não avançam as obras?

Mais uma vez gostaria de chamar o gerente, mas não há ninguém para responder, ninguém é responsável. Uma empresa que deveria servir o público, faz obras a passo de caracol e ninguém protesta. Eu protesto e se estivessem a perder receitas com portagens reduzidas as obras seriam mais rápidas.

Este hábito de protestar e de exercer os direitos é uma questão de cultura política e de atitude cívica. Mas estamos num país em que um director de um semanário afirma que tentaram levá-lo à falência para não publicar certas notícias e nada acontece (1). De facto, ninguém é responsável e não há "gerente" que possamos chamar. Professor universitário1) Devo referir que estou a falar de José António Saraiva, director do semanário Sol, em entrevista ao Correio da Manhã, no dia 22 de Novembro. Devo também clarificar que só falei uma vez com JAS e a conversa até acabou muito mal. Mas o seu a seu dono: o Sol publicou a notícia.

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