Governo espanhol aprova nova lei do aborto polémica
Por Nuno Ribeiro, Madrid
O Conselho de Ministros espanhol aprova hoje o novo anteprojecto de lei do aborto que, na prática, institui uma lei de prazos que permite a interrupção voluntária da gravidez até às 14 semanas. Esta medida suscita polémica na sociedade espanhola, tendo as associações pró-vida, a hierarquia eclesiástica e os partidos conservadores convocado já uma manifestação, em Madrid, para 17 de Outubro, durante a discussão parlamentar do diploma.
O aspecto mais contestado da nova lei é o que definia que as jovens entre os 16 e os 18 anos possam abortar sem conhecimento ou autorização dos pais. A lei da autonomia do paciente, aprovada em 2002 pelo Governo conservador de José Maria Aznar, estabelecia nos 16 anos a chamada maioridade sanitária. Mas dizia que, a partir de tal idade, os jovens podiam decidir sobre os tratamentos médicos a que eram submetidos, salvo em três excepções: interrupção voluntária da gravidez, reprodução assistida e ensaios clínicos.
O anteprojecto de lei do aborto apresentado pela ministra da Igualdade, Bibiana Aído, estabelecia que as jovens decidiam sobre a continuidade da gravidez sem necessidade de autorização dos pais. Mas a polémica suscitada obrigou o executivo espanhol a admitir uma alteração: embora a decisão caiba apenas à menor, os pais devem ser informados, numa aproximação da nova lei à legislação em vigor em França.
Um outro ponto quente do diploma que o Governo de José Luis Rodriguez Zapatero reviu é o que se refere aos comités médicos que decidem sobre a autorização dos abortos posteriores à 22.ª semana de gestação, caso seja detectada no feto uma doença extremamente grave e incurável no momento do diagnóstico. Na constituição de tais comités não deve estar nenhum médico que se tenha manifestado contrário à interrupção voluntária da gravidez.
Estas e outras alterações que o executivo socialista ainda admite efectuar durante a discussão parlamentar têm como objectivo inviabilizar o sucesso do recurso já anunciado pelo Partido Popular para o Tribunal Constitucional. O gabinete de Zapatero está ciente da oposição ao texto que pretendia ver aprovado: o Conselho Fiscal já declarou inconstitucional o anteprojecto, o Conselho Geral do Poder Judicial, o órgão de governo dos juízes, foi incapaz de chegar a acordo sobre o texto, e só o Conselho de Estado o aprovou por unanimidade.
Apesar do parecer destes órgãos ser apenas de natureza consultiva, o Governo pretende blindar o seu projecto para que a sua aprovação pelo Parlamento não seja adiada.
Dentro de três semanas, a 17 de Outubro, diversas organizações que fazem campanha contra o aborto vão organizar em Madrid uma manifestação contra a reforma da lei do aborto, com o apoio da Conferência Episcopal Espanhola e do Partido Popular. Os organizadores esperam reunir na capital espanhola um milhão de pessoas, no que será o primeiro dos confrontos do executivo espanhol com a Igreja Católica. O segundo embate vai acontecer a propósito da nova Lei da Liberdade Religiosa, que pretende incentivar o laicismo na sociedade espanhola.
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