Eleger é escolher

Maria José Nogueira Pinto

DN 20090924

Teoricamente as Legislativas têm como objectivo ocupar as bancadas da Assembleia da República com ilustres representantes do povo mas, na prática, o que está agora em causa é escolher quem vai governar Portugal, se Ferreira Leite se Sócrates. Ora, tendo Sócrates governado durante mais de quatro anos, a decisão de o manter ou de o substituir depende do escrutínio de cada eleitor sobre o que ele foi e o que ele fez durante o seu mandato, bastando para tal um pequeno e fácil exercício de memória.

Recordo-me bem da sua primeira versão: enérgico, incansável, rápido na decisão, usando a autoridade com singular incorrecção política, parecendo saber sempre o que queria e para onde ia. Foi o tempo de um plano reformista ambicioso e necessário. Mas depressa se viu que o homem não tinha painel de bordo, arrancando em todas as frentes com medidas que abanaram, perturbaram e criaram resistências; optando por um governo unipessoal; atribuindo os atrasos e percalços aos defeitos nacionais e nunca a erros seus; mudando o excesso de voluntarismo em precipitação.

Na segunda fase as reformas ficam em banho-maria, a rua transforma-se no espaço de confronto político e social por excelência, com a megamanifestação dos professores e o gravíssimo incidente da ocupação de eixos rodoviários estratégicos pelos camionistas. Vimos então um novo Sócrates, atarantado, inseguro, incapaz de accionar os mecanis- mos do próprio Estado. Perdida a autoridade, socorreu-se de um autoritarismo crescente numa sucessão de atitudes persecutórias e abusos de autoridade.

A emergência da crise dá-lhe um novo fôlego, adiando indefinidamente a avaliação do seu desempenho e do grau de execução das suas políticas, abrindo-lhe o caminho da ficção - o Portugal do 2,2%, do aumento dos postos de trabalho, sem recessão à vista - abrilhantado por um cabaz de medidas anticrise para todos os gostos. Depois seguiu-se uma radicalização ideológica "quanto baste" para compensar os votos perdidos com o desgaste, a penalização das Europeias e uma fénix renascida para uma campanha de promessas que não poderão ser cumpridas, de demagogia barata, truques de segunda e sentimentalismos à la carte.

Afinal, que fez Sócrates por nós? O que mudou foi para melhor? Que confiança nos merece? Que sabemos nós das sucessivas trapalhadas, da licenciatura, do Freeport, da TVI, da possível coligação com o BE?

Do outro lado temos Manuela Ferreira Leite. Num país onde o exercício da política foi entregue a habilidosos vendedores de promessas, em que o sentido do serviço público se perdeu, em que preponderam os interesses pessoais, os estados de alma e os caprichos, alguém que é fiável e confiável, que vive habitualmente, que conhece o real e o quotidiano, que não quer nada para si, que vem quando é difícil, que se apresenta exactamente como é, que junta princípios e competência para fazer, torna-se facilmente numa ameaça. Porque rompe com o paradigma, porque desarma, porque pode dizer que o rei vai nu.

Recordo-me como, desde o dia em que se candidatou à presidência do PSD, os habituais oráculos previram o pior: que não ganharia o congresso, que não conseguiria espaço para se constituir como alternativa, que só sabia de economia e finanças, que não tinha consciência social, que iria perder as europeias, que não tinha programa, que não tinha candidatos.

Pouco a pouco, indiferente a tudo isto, ela construiu uma alternativa, iniciou uma nova forma de fazer política, marcou os timings e foi pondo em cima da mesa os temas que fizeram a agenda política e, pela primeira vez, o PS sofreu uma oposição contundente, a derrota nas Europeias e perdeu a veleidade de fazer destas eleições uma passeata alegre.

A decisão que for tomada no dia 27 terá consequências decisivas para o que resta de Portugal e de todos nós. Um enorme risco ou uma derradeira oportunidade. É preciso escolher antes de votar.

Comentários

Lamento que defenda o PSD, que desilusão para mim e para tantos militantes e simpatizantes do CDS, vê-la a desertar, mas enganou-se, apostou no cavalo errado. Gostaria que explicasse o que aconteceu para sair do CDS, porque não percebi, minha sra. o outro lado é o CDS não é Manuela Ferreira Leite.
Chocou-me ver Fernando Reboredo Seara, que assinou o meu cartão de militante, ir atrás do poder, mudar de camisola sem mais nem menos e agora a senhora. Lamento...

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