Missas de Natal
Actualmente, o Natal é a única celebração do calendário litúrgico que contempla três eucaristias: a da noite, a da aurora e a do dia.
O Natal significa o nascimento de Cristo, que se revive numa celebração próxima da meia noite, pela convicção de que o nascimento terá ocorrido por essa hora. Por tradição se associa a época natalícia à família, pois o nascimento de uma criança é sempre motivo de reunião e celebração. A missa foi introduzida nas celebrações do Natal pelos católicos no ano 400, séc. V. Até aqui a única celebração da Igreja era a Páscoa. Esta celebração terá começado na basílica erigida no monte Esquilino, dedicada a Nossa Senhora. A escolha do dia 25 prende-se com uma convenção da Igreja, uma vez que não é possível determinar a data precisa do nascimento de Cristo. O dia 25 era considerado pelos pagãos como o dia do Sol (coincide com o solstício de Inverno). Para os católicos Deus é a luz do mundo, daí a associação a este dia. O Natal é a única celebração do calendário litúrgico que contempla três eucaristias: a da noite, a da aurora e a do dia. Destas três celebrações, a da noite (do galo) é a que reúne os aspectos históricos e humanos do nascimento de Cristo. Segundo São Gregório Magno a missa da noite comemora o nascimento temporal de Jesus; a da aurora ou do galo, celebra o nascimento de Jesus no coração dos fiéis; a missa do dia ou da festa, evoca o nascimento do Verbo no seio do Pai, ou segundo o Cónego António Neiva, professor de liturgia, “a última vinda de Jesus”. Celebrada à meia-noite, a missa do galo, «in galli cantu», passou a ser a primeira da sequência litúrgica. Seguia-se-lhe a da «aurora» ou missa de alva (introduzida no século VI) e a missa própria do dia, que no século IV fora a primitiva celebração da festa religiosa do Natal. O professor de liturgia da Faculdade de Teologia da Universidade Católica de Braga reflecte que “actualmente só se celebra a missa de manhã e a do meio dia. A chamada missa do galo decaiu muito sendo quase celebrada apenas em grandes Catedrais”, explica relembrando Roma, Lisboa ou até mesmo em Braga. A forma de celebração não é estática. “Também porque a liturgia é dinâmica, está em evolução contínua”. Assim a forma a forma de o Natal ser celebrado: cânticos, homilia, os gestos vão mudando. “Com o andar do tempo a linguagem fica desactualizada e é necessário renovamento”, manifesta o Professor de liturgia. A expressão “Missa do Galo” é específica dos países latinos e deriva da lenda ancestral que aponta ter sido a única vez que um galo cantou. Uma outra lenda, de origem espanhola, conta que antes de baterem as 12 badaladas da meia noite de 24 de Dezembro, cada lavrador da província de Toledo, em Espanha, matava um galo, em memória daquele que cantou três vezes quando Pedro negou Jesus, por ocasião da sua morte. A ave era depois levada para a Igreja a fim de ser oferecida aos pobres, que viam assim, o seu Natal melhorado. Era costume em algumas aldeias espanholas e portuguesas, levar o galo para a Igreja para este cantar durante a missa, significando isto um prenúncio de boas colheitas. Nos primeiros séculos, as vigílias festivas eram dias de jejum. Os fiéis reuniam-se na Igreja e passavam a noite a rezar e a cantar. A Igreja era toda iluminada com lâmpadas de azeite e com tochas. A iluminar a Palavra de Deus havia círios e tochas junto do altar, enquanto que as paredes eram revestidas de panos e tapetes. O templo era perfumado com alecrim, rosmaninho e murta. Em alguns locais mais frios, era costume deitar palha no chão para aquecer o ambiente. O jejum da vigília conduzia ao desprendimento e contemplação do mistério religioso. Quando se aboliu o jejum, o povo continuou a chamar consoada à ceia de Natal, embora fosse mais abundante. Como era costume comer peixe, esta tradição continuou. O termo “consoada”, que significa pequena refeição, surgiu no Séc. XVII, mas só se divulgou quando a classe mais rica começou a realizar uma pequena refeição após a missa da vigília do Natal. Nas últimas décadas do séc. XIX e primeiras do séc. XX, a pobreza no meio rural era muito grande, e para boa parte da população era uma noite igual às outras. A vigília de Natal começava com uma oração, com a leitura de Palavra de Deus, pregação e com um canto. Após a missa seguia-se a representação de um auto de Natal, dentro da Igreja. Antes do sol nascer, rezava-se a missa do galo ou da aurora. A meio da manhã do dia 25, celebrava-se a missa da festa. Ao entrar na Igreja, a grande curiosidade era o presépio. A missa de Natal começava com um cântico natalício. No momento do “Gloria in excelsis Deo”, as campainhas tocavam para assinalar o nascimento do Redentor. No fim da missa, todos iam beijar o menino. Em algumas Igrejas, o presépio estava tapado até à altura do cântico. Tradição na Madeira Na missa da meia-noite apagam-se as luzes e apenas um foco incide sobre o anjo vestido de branco, com as asas resplandecentes. O anjo ergue as mãos para o céu e canta: Eu vim do céu à terra De mandado do Senhor Para vos anunciar O Menino de Deus Pai... A representação do nascimento do menino consta actualmente de mostrar ao público o Deus Menino o que, nalguns lugares, é feito por uma criança vestida de anjo, que entoa uma melodia própria. Segue-se a entrada dos pastores - as “romagens” - em que tomam parte numerosos fiéis de ambos os sexos, aos grupos ou isolados, como embaixadores dos sítios, cumpridores de votos ou de simples actos individuais de devoção. Antigamente cada pessoa que levava a sua oferta, ao chegar ao altar, cantava uma estrofe ao menino Jesus, actualmente as pessoas juntam-se aos grupos, muitas vezes por sítios e ensaiam uma canção com letra e música próprias, inventada por alguém do sítio. Os seus versos, novos em cada ano que passa, falam de paz, do Menino que nasce, dos que estão longe deles nesta quadra, votos, preces, acções de graças. Cada pastor leva uma oferenda e entra no templo por entre alas de povo, cantando ao som de instrumentos regionais, e ajoelha junto da imagem do Menino Jesus com a oferta à cabeça, às costas ou nas mãos. Os sítios das diversas freguesias chegam a viver uma verdadeira competição entre si para ver quem deslumbra mais a assembleia reunida na igreja. Os presentes constam de produtos da terra, animais vivos, fruta, ovos, géneros alimentícios e dinheiro, destinados ao pároco. Em algumas paróquias as romagens são feitas antes da “Missa do Galo”, para que a cerimónia não se prolongue pela madrugada fora. Só após estas “romagens” é que o povo volta para casa para comer a canja, já que a tradição da consoada não encontrou implantação na ilha da Madeira. Tradição no Alentejo A noite de Natal, em várias localidades alentejanas celebra-se sem a Missa do Galo. Apesar desta ser o centro de toda a comemoração a tradição – muito viva no Alentejo – de representar os chamados “presépios vivos” pode assumir o seu lugar, como acontece , por exemplo, na paróquia da Trindade, em Beja. A iniciativa partiu dos próprios fiéis e os que há muito saíram da aldeia deslocam-se propositadamente nesta altura para participar dos ensaios. O que se faz é contar a história do nascimento de Cristo, mas em verso. Os autos de Natal inserem-se na tradição do teatro popular e primariamente eram representados ao ar livre, na noite de Natal, das 21h às 06h00. Hoje o auto de Natal continua a demorar horas, em local mais abrigado. Ecclesia, 23.12.2009 |
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