Desemprego e atitude

João César das Neves
DN20091214
O desemprego é o elemento mais dramático da crise. Não só o impacto produtivo é terrível mas os seus efeitos estão longe de ser apenas económicos ou financeiros. Nos tempos que correm, a profissão faz parte da identidade pessoal, e perdidas referências espirituais ou ideológicas, muita gente coloca na sua ocupação a própria razão de existir. Isso torna terrível a evolução da taxa, que começou a subir em 2001 e atinge níveis históricos.

O sofrimento é grande, mas lidar com um mal destes exige abandonar emoções e falácias, enfrentando de forma clara e decisiva a questão. A única forma de combater o desemprego é através de uma das coisas mais simples e mais exigentes: mudar atitudes.

Primeiro é preciso compreender que estar desempregado não é vergonha e pedir emprego é uma honra. Dignificar a situação é meio caminho para a resolver.

Depois há que recusar a armadilha política e esquecer o uso da questão como munição na luta de almofadas partidária que alimenta o ocioso circo mediático. O desemprego é uma questão económica, resolvida nas empresas, mercados e investimentos. Neste processo, os programas estatais costumam complicar mais que ajudam, mesmo quando se enganam presumindo da própria eficácia. Os melhores governos são os que estragam pouco, mas há muito que não temos desses por cá.

O terceiro erro consiste em achar que os empregos nascem nas árvores. Procura-se trabalho como numa apanha de frutos em pomar rebuscado. Os empregos primeiro criam-se, só depois podem ser ocupados. Muitos desempregados deveriam lançar o próprio negócio, sem acreditar na geração expontânea de tarefas. Trabalhar é ser útil, criar valor. O mal está na opinião pública, que começa por desprezar empresários e gestores, tratando-os como exploradores, parasitas ou pior. Depois, o Governo persegue-os com impostos, regulamentos e fiscalizações. No final, todos se surpreendem por faltarem postos de trabalho.

Outro disparate é pensar que se trabalha no que se quer, não no que é preciso. Não existe falta de empregos em Portugal, que criou centenas de milhares nos últimos anos. Esses trabalhos não agradaram a nacionais e tiveram de vir multidões de emigrantes para os ocupar. Mesmo com a crise persiste a falta de trabalhadores em muitas funções. É difícil encontrar canalizadores e electricistas enquanto sobram advogados e professores. Para funções à secretária há chusmas de candidatos, mas noutras secções as disponibilidades são escassas. Ainda há quem se indigne por já não ser verdade que o curso superior garante emprego bom e fácil. Mas é assim há mais de 20 anos. No antigo regime a escassez de licenciados concedia-lhes facilidades momentâneas, há muito desaparecidas. É tempo de compreender a realidade e procurar estudos e formações úteis, não pomposas. Aí o Estado só complica.

A quinta tolice é pensar que, porque o montante de trabalho é fixo, os empregados tiram empregos aos desocupados. Esta velha falácia é persistente, apesar de sempre negada. É trabalhando que se gera a necessidade de mais trabalho. Aqui não há partilha, mas crescimento. Ou queda se, em vez de aumentar o bolo, se lutar pela sua divisão.

Isto leva à estupidez suprema de considerar obsoletas e fora de prazo pessoas de certa idade, ainda com décadas de capacidade e eficácia à sua frente. Usar a reforma para promoção do emprego é um infame crime nacional, que estrangula empregos e paralisa a economia. Também aqui o erro tem origem histórica há muito inválida. Há décadas a saúde precária recomendava reforma aos 60 anos, que na altura era impossível. Hoje, podendo pagar, isso já não é preciso porque as pessoas vivem válidas até muito mais tarde. Políticos míopes usam o tema para demagogia e criam problemas terríveis. O mais espantoso é os próprios aceitarem a ociosidade e inacção, na triste irrelevância que lhes custa tanto quanto ao País.

Como o sistema económico funciona, não é fácil fazer subir o desemprego. Mas, como se vê, é possível atingir a catástrofe actual através de erros fortes e consistentes.

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