Lições de uma epidemia
Daniel Sampaio, Público, 23.11.2014
No momento em que escrevo (16/11), as autoridades de saúde portuguesas consideraram "controlada" a epidemia de Legionella.
No momento em que escrevo (16/11), as autoridades de saúde portuguesas consideraram "controlada" a epidemia de Legionella.
É preciso dizer que os serviços de saúde, nas suas diversas vertentes, fizeram um notável trabalho. Desde o início a população foi informada sobre as precauções a tomar, os dados sobre a evolução da doença foram transmitidos todos os dias e as unidades hospitalares, por certo no limite do esforço, souberam dar a resposta adequada. Em pouco tempo, os focos de transmissão da doença foram determinados, os doentes foram bem tratados e a epidemia foi controlada. O Serviço Nacional de Saúde, mais uma vez, mostrou uma notável capacidade de resposta e tornou evidente como é crucial preservá-lo, para bem de todos nós. Os responsáveis da Saúde, com destaque para o ministro da Saúde, Paulo Macedo, e para o director-geral da Saúde, Francisco H. George, demonstraram, desde o início da epidemia, uma notável capacidade de actuar no momento certo e no local apropriado, assegurando a transparência informativa que contribuiu para o êxito.
Uma das lições mais evidentes foi a constatação de que a Saúde Pública é uma disciplina fundamental da Medicina. Tida por alguns médicos hospitalares como uma área menor, considerada por outros como só se preocupando com a dimensão preventiva, a recente epidemia mostrou bem como os médicos de Saúde Pública, pelo seu grande conhecimento do terreno e pela sua experiência de trabalho em rede, são essenciais quando surge uma doença grave.
Filho de um médico de Saúde Pública, Arnaldo Sampaio, que tanto contribuiu para a divulgação desta perspectiva, fico satisfeito com os resultados obtidos. Alegro-me sobretudo com a capacidade de trabalho, eficiência e competência demonstradas pelo meu amigo Francisco George. As suas intervenções nos meios de comunicação social e a aptidão que demonstrou para mobilizar e articular serviços foram exemplares.
No seu livro Histórias de Saúde Pública (Livros Horizonte, 2004), Francisco George escreve: "O pensamento conceptual terá de compreender a evolução das intervenções actuais reservadas à Saúde Pública. Isto é, conhecer o que esperam e o que exigem os cidadãos para que o Estado garanta a sua protecção, a promoção da saúde e a prevenção das doenças. E também, por outro lado, que amplitude de participação o Estado possibilita aos próprios cidadãos no processo de planeamento, gestão e avaliação da saúde. (…) a nova Saúde Pública tem de saber conviver com a Comunicação Social de hoje. Convívio baseado no respeito mútuo, no equilíbrio, na colaboração próxima e recíproca, aberta e assumida, no interesse da defesa conjunta do princípio unificador do dever, que a todos incumbe, em assegurar a promoção da saúde das populações e, assim, criar condições favoráveis ao desenvolvimento humano."
Escritas há dez anos, estas palavras conservam toda a actualidade. A comunicação social, que desempenha um papel fundamental na denúncia do que está a corromper a democracia, pode ser mobilizada para causas essenciais à defesa da saúde das populações, como o combate à epidemia de Legionella acaba de demonstrar.
Comunicar bem, sem alarmismos mas com transparência, é essencial para obter resultados. Oxalá esta luta contra a epidemia da doença dos legionários contribua para a melhoria dos nossos serviços de Saúde Pública e para uma maior consciência da importância da Saúde Comunitária.
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