O lugar da fruta
Público 20110730 Miguel Esteves Cardoso
O homem do lugar de frutas ouviu-me e saiu de cena para dar uma pancada de morte, que ouvi. Voltou com um coelho despelado, ainda morno no saco de plástico. Senti-me um assassino encomendado. Desde então, só como coelho com a maior das culpas e a cada vez mais amarga memória daquele dia: quanto mais disfarçado e culturalmente justificado, melhor. Isto é, só como à caçador: a coisa, hipocritamente, que menos sou.
Faltam-nos nomes. Como se chama o lugar onde compramos os jornais e as revistas? É um quiosque? É uma tabacaria? É uma papelaria? É um ardina? Não é nada dessas coisas. O lugar de frutas diz tudo, recusando-se a dar-lhe um nome. Não é nem uma frutaria nem uma hortaliceira. É um nome agradavelmente errado - mas suficiente próximo. Sugiro, consciente que é horrível, "lugar de impressos". Dá para jornais, revistas, livros e panfletos. O segredo - o centro essencial - é lugar.
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