Nossa Senhora do Ar
P. JOÃO FANHA 16.11.2018
Fiquei comovido pela forma como me apresenta este pedido.
Diz que gostava de pedir-me ‘umas palavras sobre esta Nossa Senhora’ do Ar: o gosto é meu.
Porque esta Nossa Senhora do Ar é exactamente a mesmíssima Santíssima e Bem Aventurada Virgem Maria, Mãe de Deus, e Protectora da Nação Portuguesa.
E também Rainha de Portugal enquanto Nossa Senhora da Imaculada Conceição, minha madrinha de baptismo.
Por isso tudo o que a Ela diga respeito me é muito querido.
Desde os primórdios da aviação, aqueles audazes que andavam mais perto do céu,
na incerteza de voltarem, sãos e salvos, a pôr pé em terra,
recorrem à protecção do alto e, mais naturalmente ao ‘amparo maternal’.
Em Terras de Santa Maria é natural esta devoção pela Mãe do Céu.
Não sabemos exactamente como, mas percebemos o porquê de se associarem as viagens aéreas
à Transladação da Santa Casa de Nazaré para Loreto, e como tal a Nossa Senhora do Loreto.
Sabemos que já em 1912 a Sociedade de Aviadores e Aeronautas sedeada em Torino era sua devota.
Foi eleita Padroeira da Aviação Espanhola em 1913.
Sua Santidade o Papa Bento XV, a 24 de Março de 1920, declarou Nossa Senhora do Loreto, Padroeira Universal da Aviação.
Por cá, nessa altura, os voos eram mais rasantes: só depois de 1953 se individualizou o ramo da Força Aérea;
até lá a Aeronáutica Militar fazia parte da Marinha e a aviação civil tinha pouca expressão.
Não nos admiramos que fosse um almirante a fazer a gloriosa travessia aérea de Lisboa para o Rio de Janeiro. Sabemos que nas vésperas da partida para outra e ainda maior travessia, de Vila Nova de Milfontes para Macau, os seus protagonistas estiveram ali perto, em Colos, onde ocorria festa religiosa com procissão.
Ora o orago de Colos é Nossa Senhora da Assunção e podemos imaginar o que é que aqueles homens terão sentido ao ver a imagem da Virgem recortada no azul do firmamento daquele primaveril dia 5 ou 6 de Abril de 1924.
O que é certo é que o então Comandante da Base Aérea de Sintra e Director do Clube Aéreo de Portugal, Major Cifka Duarte, em pleno republicanismo anti-católico militante, encabeça um movimento emergente com vista à vivencia da fé na aviação.
E, claro, era impensável ter uma padroeira importada de Itália e proclamada por Roma; tinha que ser popular e nacional. Teve conhecimento que a Mãe do Céu era invocada numa ermida na Serra de Todo o Mundo, perto de Landal, Caldas da Rainha, precisamente como Nossa Senhora do Ar.
Pede ao seu amigo e poeta Silva Tavares que componha uns versos que sejam a futura ‘Oração do Aviador’, que aparecem publicados no Diário de Lisboa de 12 de Março de 1926.
Estala a polémica: na Câmara dos Deputados, quatro dias depois, um deputado invoca que “foi educado junto de pessoas católicas e não conhece essa senhora”.
Denunciando “que os rapazes da aviação tenham inventado para sua padroeira ‘Nossa Senhora do Ar', pretende “que a Constituição seja cumprida” e invoca que “os regulamentos disciplinares não permitem que eles façam o movimento que pretendem fazer”.
Como entretanto se aproximava a reabertura ao culto da capela da Granja do Marquês, já então Base Aérea nº 1, capela essa dedicada a Nossa Senhora da Assunção, D. António Mendes Belo, Cardeal Patriarca de Lisboa e Ordinário Castrense, providenciou a vinda de Paris duma imagem de Nossa Senhora da Assunção que pudesse também ser invocada como Nossa Senhora do Ar.
Foi no dia 14 de Agosto de 1926 que se iniciou oficialmente o culto a Nossa Senhora do Ar como padroeira da aviação em Portugal, com a celebração eucarística presidida por Sua Eminência na capela da Granja do Marquês, a partir daí dedicada a Nossa Senhora do Ar, cuja imagem está a partir de então aí colocada no trono do altar principal.
Muitas réplicas passaram a ser feitas a partir de então, não só para os lugares de culto nas diversas unidades da Força Aérea, mas também para uso e devoção particular, inclusive nas ex-colónias.
A 19 de Dezembro de 1959, o Governo de então, com especial recomendação de D. Manuel Gonçalves Cerejeira, Cardeal Patriarca de Lisboa e Ordinário Castrense, informando que todas as capelas da Força Aérea de Portugal são dedicadas a Nossa Senhora, “onde é venerada uma Sua imagem que figurando o mistério da Sua Gloriosa Assunção, os aviadores A chamam ‘Nossa Senhora do Ar’ dirige-se à Santa-Sé a rogar a graça da declaração de “Nossa Senhora do Ar” como Padroeira Nacional da Força Aérea Portuguesa.
A resposta foi quase imediata: no Breve ‘Aligera Cymba’ datado de 15 de Janeiro de 1960, Sua Santidade o Papa S. João XXIII declara “para sempre, a Bem Aventurada Virgem Maria, sob a invocação de Nossa Senhora do Ar, Celeste Padroeira de Todos os Aviadores Portugueses,
com todas as honras e privilégios litúrgicos, próprio dos santos patronos”.
Os aviadores portugueses passaram assim a ter a Mãe do Céu como advogada celeste duplamente reconhecida pelo Anel de Pedro: Nossa Senhora do Loreto padroeira dos aviadores de todo o mundo; e Nossa Senhora do Ar padroeira dos aviadores de Portugal.
Para culminar o reconhecimento e proclamar o padroado foi escolhida uma data e um local cheio de simbolismo: ocorreu no dia 18 de Agosto de 1960, 8º aniversário da constituição da Força Aérea, na capela da Unidade da Força no alto da Serra da Estrela, junto à Torre.
A oficial e solene Entronização de Nossa Senhora do Ar cumpriu-se a 20 de Outubro de 1995, na Capela da Nossa Senhora do Ar, na Base Aérea nº1, sob a presidência litúrgica do Eminentíssimo Cardeal Patriarca de Lisboa e Ordinário Castrense D. António Ribeiro.
Comentários