Conto de Páscoa
JOÃO LUIS CÉSAR DAS NEVES DN 31.03.2018
Jesus de madrugada voltou ao Templo e todo o povo vinha ter com Ele. Jesus sentou-se junto ao pátio das mulheres e pôs-se a ensinar. Então os doutores da Lei e os fariseus decidiram fazê-lo cair numa armadilha para terem com que o acusar.
Um deles encontrou uma mulher apanhada em adultério e sugeriu que a levassem a Jesus para ver o que Ele dizia. Mas os outros responderam: "Adultério?! Qual é o mal disso? És mesmo sexista! Antigamente, em tempos intolerantes, isso era um grave delito, mas hoje o amor é livre; cada um faz o que quer, desde que sejam adultos com consentimento. Vivemos numa sociedade aberta e tolerante, que respeita as opções de uma vida sexual e reprodutiva saudável, gratificante e responsável."
Outro doutor trouxe um homem que fora apanhado em assédio sexual. Então todos se enfureceram, como antigamente faziam num adultério, e levaram-no a Jesus. Colocaram-no no meio e disseram-lhe: "Mestre, este homem foi apanhado a pecar em flagrante assédio com uma funcionária da empresa. Os media, que hoje são lei, mandam-nos tratar à pedrada tais homens. E Tu que dizes?"
Jesus, inclinando-se para o chão, pôs-se a escrever com o dedo na terra. Como insistissem em interrogá-lo, ergueu-se e disse-lhes: "Quem de vós estiver sem pecado atire-lhe a primeira pedra!" E, inclinando-se novamente para o chão, continuou a escrever na terra.
Ao ouvirem isto foram saindo um a um, a começar pelos mais velhos, pois nesta sociedade livre e tolerante há muito assédio. Então um empresário disse: "Eu sempre respeitei as minhas colaboradoras e nunca abusei do meu poder." Pegou numa pedra e preparava-se para a atirar, quando viu a mulher que tinha sido apanhada em adultério com ele, que ainda andava por ali. Largou a pedra e retirou-se.
Em seguida um político gritou: "Será que este bandido fica impune? Já não há respeito pelas mulheres de Jerusalém? Não! É preciso apedrejá-lo! Eu sou um servidor da causa pública, honesto e respeitador, e atiro a primeira pedra." Ouvindo isto toda a gente, incluindo o homem acusado, desatou a rir, e o político, no meio das gargalhadas, afastou-se.
Já havia pouca gente quando saiu do pátio das mulheres uma activista feminista. Perguntou o que se passava e, quando lhe contaram, enfureceu-se e pegou numa pedra. Mas uma vizinha disse-lhe: "Tu sem pecado? Tens é memória curta." As mulheres de Jerusalém começaram a conversar entre si e a contar várias histórias da outra que, caindo em si, deitou fora a pedra e retirou-se cabisbaixa.
Ao fim de algum tempo, muito mais do que no episódio original porque numa sociedade aberta e tolerante os fariseus são bastante mais e bastante mais hipócritas, Jesus ficou só com o homem. Então, ergueu-se e perguntou-lhe: "Homem, onde estão eles? Ninguém te condenou?" Ele respondeu: "Ninguém, Senhor." Disse-lhe Jesus: "Também Eu não te condeno. Vai e de agora em diante não tornes a pecar." (cf. Jo 8, 1-11)
As mulheres de Jerusalém, entrando de novo no seu pátio, foram para a hashtag #MeToo conversar sobre o que tinha acontecido. Uma delas escreveu: "Ele não desculpou o homem. Limitou-se a mostrar que não havia ali ninguém sem pecado." Outra respondeu: "Se alguém tivesse atirado a primeira pedra, todos se teriam matado uns aos outros à pedrada. A árvore de Jerusalém está seca."
Algum tempo depois, Jesus voltou a encontrar as mulheres de Jerusalém, desta vez nas ruas da cidade. Elas batiam no peito e lamentavam-se por Ele. Jesus voltou-se para elas e disse-lhes: "Filhas de Jerusalém, não choreis por mim, chorai antes por vós mesmas e pelos vossos filhos; pois virão dias em que se dirá: "Felizes as estéreis, os ventres que não geraram e os peitos que não amamentaram." Hão-de, então, dizer aos montes: "Caí sobre nós!" E às colinas: "Cobri-nos!" Porque, se tratam assim a árvore verde, o que não acontecerá à seca?" E levavam também dois malfeitores, para serem executados com Ele (cf. Lc 23, 27-32). Um deles era o homem que tinha sido apanhado em assédio, e o outro o empresário, entretanto acusado de peculato e branqueamento de capitais.
Dois dias depois, as mulheres de Jerusalém procuraram de novo ver Jesus, mas Ele faltou ao encontro. Chegaram ao local combinado e diziam entre si: "Quem nos irá tirar a pedra da entrada do sepulcro?" Mas olharam e viram que a pedra tinha sido rolada para o lado; e era muito grande. Entrando, viram um jovem sentado à direita, vestido com uma túnica branca, e ficaram assustadas. Ele disse-lhes: "Não vos assusteis! Buscais a Jesus de Nazaré, o crucificado? Ressuscitou; não está aqui. Vede o lugar onde o tinham depositado. Ide, pois, e dizei aos seus discípulos e a Pedro: "Ele precede-vos a caminho da Galileia; lá o vereis, como vos tinha dito"." (cf. Mc 16, 3-7) Voltando do sepulcro, foram contar tudo isto aos Onze e a todos os restantes, mas as suas palavras pareceram-lhes um desvario, e não acreditaram nas mulheres de Jerusalém (cf. Lc 24, 9-11).
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