O meu trabalho tem sentido? O importante é perguntar.
LUÍS LOBO XAVIER OBSERVADOR 22.03.17
Percebi que muitas vezes ter um trabalho bom e confortável nos condiciona e não nos deixa tentar ir mais longe. Portanto, se queria procurar esse “Mais”, tinha que sair da minha zona de conforto.
O trabalho, seja num escritório, num hospital, numa fábrica ou noutro sítio qualquer, é provavelmente o local onde, na nossa vida, passamos mais tempo acordados. Por semana trabalhamos 35, 40, ou até mais horas. A maior parte de nós trabalhará até aos 70 anos, talvez mais.
Muitas das nossas competências e qualidades são aplicadas no nosso trabalho. Muitas das pessoas com quem convivemos são pessoas que trabalham connosco.
Visto desta forma, o trabalho tem um peso enorme na nossa vida, e isso tem-me levado muitas vezes a questionar o sentido do meu trabalho.
Trabalho apenas para garantir o meu sustento, para ocupar o meu tempo? Ou o meu trabalho pode ter um sentido maior? Desde sempre tive esta pergunta constante na minha cabeça. E qual água mole em pedra dura, a procura por esse sentido acabou por me motivar a uma grande mudança profissional há uns anos atrás.
No início da minha vida profissional trabalhei durante cinco anos no planeamento estratégico de uma grande empresa portuguesa. Foi uma grande experiência, um trabalho muito interessante e intelectualmente estimulante, tinha uma liderança excecional, excelentes condições de trabalho e boas perspetivas de desenvolvimento de carreira. No entanto, apesar de gostar muito do meu trabalho, os anos passavam e eu sentia que faltava alguma coisa. Faltava o tal “sentido”.
Um dia, num workshop interno sobre inovação e criatividade, foi pedido a cada pessoa que escrevesse num cartão qual o objetivo que cada um mais quereria perseguir na sua vida profissional. Escrevi no meu cartão “Trabalhar pelo Bem Comum”. Durante quase dois anos este cartão esteve pousado na minha secretária em frente aos meus olhos. E na verdade não era isso que eu estava a fazer. Não que achasse errado trabalhar numa grande empresa que procura o lucro. Nada disso. Tinha e tenho bem claro que para haver riqueza para distribuir é preciso que haja quem trabalhe para a criar. Mas senti que a minha vocação poderia ser mais do que isso. Sabia que o meu trabalho tinha muitas coisas boas. Mas não estava a cumprir o que escrevi no meu cartão.
Percebi que muitas vezes ter um trabalho muito bom e confortável nos prende, nos condiciona, e não nos deixa tentar ir mais longe. E portanto, se queria procurar esse “Mais”, tinha que sair da minha zona de conforto. E assim, há cinco anos atrás, decidi que ia sair do meu trabalho.
Passei dois anos a desenvolver projetos em Portugal e Moçambique, a estudar, a trabalhar em ONGs, a viajar. Este período deu-me tempo e disponibilidade interior para pensar onde é que eu gostaria de trabalhar, o que é que gostaria de fazer. Ajudou-me a conhecer-me melhor e a fortalecer o meu propósito de trabalhar para o bem comum. Depois tive a sorte de encontrar um trabalho onde posso realizar as minhas aspirações, gerindo projectos de elevado impacto social nas áreas da saúde, sustentabilidade e desenvolvimento humano.
Hoje estou contente por ter arriscado ir à procura de um sentido para o que faço. Percebi que essa procura tanto pode fazer com que mudemos de trabalho, como nos pode fazer ficar exactamente no mesmo sítio, mas dando um sentido diferente ao que fazemos. O importante é fazer a pergunta!
Outra pergunta que podemos fazer a nós próprios, principalmente quando temos um trabalho muito interessante e estimulante, é: Será que o nosso trabalho não nos está a afastar da nossa vida pessoal e familiar? Seja porque trabalhamos horas a mais, ou porque não desligamos do telemóvel, do email do trabalho, das preocupações — com os altíssimos objetivos de vendas, ou com aquela apresentação muito importante para o cliente.
É fundamental que consigamos garantir tempo — em quantidade e qualidade — para outras coisas que não o trabalho. Seja tempo para a família, seja tempo para nós próprios e para o nosso equilíbrio pessoal e espiritual, seja ainda para atividades de voluntariado ou outras que nos permitam contribuir para a construção de um mundo melhor.
O trabalho, por muito bom que seja, às vezes faz lembrar aquelas plantas invasivas que crescem e ocupam cada vez mais espaço. E por isso temos que saber definir bem qual é o limite. Já ouvi muitas pessoas dizer “quem me dera ter passado mais tempo com os meus filhos!” mas não me lembro de ouvir alguém dizer: “quem me dera ter passado mais umas horas no escritório…” Mais uma vez, o importante é fazer a pergunta.
Ter um sentido para o que fazemos e procurar um bom equilíbrio de vida são as grandes aspirações dos jovens profissionais nos dias de hoje. Estes e outros temas vão ser discutidos no 1º Encontro ACEGE NEXT, no próximo sábado, dia 25, entre as 9h e as 13h no Museu do Oriente (inscrições e mais informações aqui).
Gestor, membro da Direção da ACEGE (Associação Cristã de Empresários e Gestores)
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