A Esperança

Relembrei, ouvindo dizer – maravilhosamente – estas palavras de Péguy pelos actores do Teatro do Ourives na celebração do meio século de uma grande amiga.
Parece-me apropriado lembrar que a Esperança não é um estado psicológico, mas uma condição estrutural do homem, porque, como virtude teologal, foi inscrita por Deus no coração do homem. Nestes tempos de desalento, é útil procurarmos dentro de nós o ânimo que nasce da certeza de um futuro bom.

Mas a esperança, diz Deus, cá está o que me espanta
A mim mesmo.
Isso é que é espantoso.

Que essas pobres crianças vejam como tudo isso corre e creiam que amanhã as coisas irão melhor.
Que elas vejam como as coisas corrrem hoje e ceiam que irão melhor amanhã de manhã.
Isso é que é espantoso e é decerto a maior maravilha da nossa graça.
E eu próprio estou espantado.
E é preciso que a minha graça seja efectivamente de uma força incrível.
E corra de uma fonte e como um rio inesgotável.
Desde essa primeira vez que ela correu e desde sempre que ela corre.
Na minha criação natural e sobrenatural.
Na minha criação espiritual e carnal e outra vez espiritual.
Na minha criação eterna e temporal e outra vez eterna.
E dessa vez, oh! Dessa vez que ela correu como rio de sangue, do flanco aberto do meu filho.
Qual não terá de ser a minha graça e a força da minha graça para que esta pequena esperança, vacilante ao sopro do pecado, trémula a todos os ventos, ansiosa ao mais fraco sopro,
Seja tão invariável, se aguente tão fiel, tão direita, tão pura; e invencível, e imortal, e impossível de extinguir; como essa chamazinha do santuário.
Que arde eternamente na lâmpada fiel.
Uma chama tremelicante atravessou a espessura dos mundos.
Uma chama vacilante atravessou a espessura dos tempos.
Uma chama ansiosa atravessou a espessura das noites.
Desde essa primeira vez que a minha graça correu para a criação do mundo.
Desde essa vez que o sangue do meu filho correu para a salvação do mundo.
Uma chama impossível de atingir, impossível de extinguir ao sopro da morte.

O que me espanta diz Deus, é a esperança.
E não volto a mim do espanto.
Esta pequena esperança que tem ar de coisa nenhuma.
Esta mocinha esperança.
Imortal.
Charles Péguy
O Pórtico do Mistério da Segunda Virtude

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