O niilismo como conseqüência de uma presunção antropocêntrica

Luigi Giussani
outubro de 1994, entrevista concedida a Giulio Andreotti 

O niilismo é a conseqüência inevitável de uma presunção antropocêntrica segundo a qual o homem é capaz de salvar-se a si mesmo. Isso é tão não verdadeiro, que todos aqueles que vivem defendendo essa posição, no final, até abertamente, se sentem dispersos num maniqueísmo do qual procuram espantar a amargura por meio de imaginações emprestadas das religiões orientais ou mesmo de movimentos de outro gênero do mundo ocidental, também espiritualistas. Emprestando imagens do mundo oriental ou de determinados âmbitos do mundo ocidental, que no fundo sempre põem em prática um ideal panteísta. Thomas Mann, por exemplo, em seu Os Buddenbrook, descreve o último homem capaz de defender a enorme riqueza acumulada pelos Buddenbrook: uma história dramática, ou melhor, trágica; nele se torna trágica. No dia repleto de trabalho, cheio de esforços para conseguir manter de pé toda a herança recebida do pai, do avô, ele só se pode dar ao luxo de dez minutos, de quinze minutos de repouso. Atirado na poltrona, ele toma fôlego, diz Thomas Mann, pensando sempre naquele último momento no qual a sua gota será reabsorvida pelo grande mar – não sei se diz do ser, como nós dizemos, ou não –, pelo grande mar do ser, desaparecendo assim enquanto gota, enquanto individualidade, e mergulhando na apaziguadora homologação universal. Parece-me que essa página de Thomas Mann seja significativa, paradoxalmente, eu diria, como exemplo do aspecto positivo – se é que podemos falar de aspecto positivo – desse niilismo último que cada vez mais domina o mundo, desde a revolta dos séculos XVII e XVIII, ou melhor, antes até, por certos aspectos, desde o próprio protestantismo, até os nossos dias. 

(“Existe porque está presente”, in: 30Dias, nº 9, outubro de 1994, p. 12)

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