IVA da restauração: apenas uma birra

Henrique Monteiro
Expresso, 20151105

Percebo que se queira aumentar o salário mínimo, ainda que para níveis incomportáveis pelas empresas. Posso não concordar, mas entendo o raciocínio. Como princípio, quem trabalha não deve ter dificuldades em suprir as suas necessidades básicas. Como percebo que se aumentem pensões e se corte na TSU (ainda que fique desconfiado sobre os efeitos na Economia que tais medidas terão). Ou seja, compreendo que nessas medidas há um racional que foi sempre associado à esquerda ou a parte dela. O que já não entendo, senão como uma birra, é a baixa do IVA para a restauração. 
Ou melhor, como é óbvio, reconheço que a ideia é boa para os empresários de hotelaria e que melhor seria se uma baixa de impostos se destinasse a todos os empresários e trabalhadores. Mas não me entra por que motivo todos os que não pertencem à restauração (ou quase) pagarão para os de hotelaria. Porque a baixa de 10% no IVA da restauração é como tudo – alguém vai ter de pagar - os contribuintes. 
Mais de pé atrás fico quando os responsáveis do sector alertam, provavelmente cheios de razão, ser “impensável falar em diminuir preços”, como referiu ontem ao Expresso Diário José Manuel Esteves, diretor geral da Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (ARHESP). E acrescenta: “Não nos peçam para baixar preços, porque nunca os aumentámos, mesmo com a loucura do IVA que temos de pagar trimestralmente”. 
Por isso, a devolução de 10% de IVA na restauração não serve para os clientes. Estes pagarão o mesmo. Porém, os responsáveis da ARHESP dizem que criarão emprego. Mas, nesse caso, o dinheiro que ficará disponível não servirá para se ressarcirem das perdas terríveis que tiveram com o aumento do IVA? 
Desconfio. 
Ultimamente têm aparecido interessantíssimos conceitos novos de restauração. Não falo só dos mercados transformados (Ribeira, Campo de Ourique e Algés são os que conheço), mas de variadíssimas ‘tascas’ modernas que surgiram. O turismo em Lisboa e Porto tem aumentado exponencialmente, pelo que os bens e impostos pagos por esses turistas correspondem (embora não se possa contabilizar com rigor) a autênticas exportações. Os empresários, ao que parece, teriam acomodado as contas de modo a que ao aumento do IVA não correspondesse um aumento de preços (dizem). Tínhamos tascas (antigas) e restaurantes ou casas a servir refeições a mais. O que não correu bem? O desemprego. Na verdade, há dados que dizem que houve bastante desemprego neste sector. Mas, honestamente, alguém acredita que esse desemprego se desvaneça com a descida do IVA? 
Depois, há todas as outras atividades. As papelarias, as drogarias, os cabeleireiros, os mecânicos, que continuarão a pagar a taxa máxima de IVA. Todos fizeram sacrifícios, mas nenhum sairá beneficiado. Os únicos serão os hoteleiros e donos de restaurantes. Porquê? O turismo diminuía? Não! A frequência diminuiu? Sim, mas como não houve aumento de preços, tal deve-se a dificuldades de dinheiro dos clientes. Não abriram restaurantes? Abriram. Bom, nesse caso o problema parece-me uma birra política. 
Há outra birra, aliás, do género de que não vou falar agora. A reposição da isenção de taxa moderadora para a Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG). Um ser humano com diabetes, doenças no coração, varizes, colesterol, o que for, paga. Mas para um aborto, uma mulher está isenta. A pessoa que não vir aqui uma injustiça ou é cega ou tem preconceitos que vão daqui até à Lua.

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