Eutanásia, tema fraturante

Teresa Tomé Ribeiro
JN 08.03.2016

Na última década temo-nos habituado a assistir a discussões sobre a vida. Discussões levantadas mais por oportunismos políticos, associados a interesses económicos e em alguns casos também interesses pessoais. Não com a necessidade e preocupação de resolver os problemas das pessoas. Se assim fosse, a resposta não seria: "sim eu percebo que está mal, que a sua doença já não tem cura, por isso concordo consigo que mais vale morrer do que estar aqui a dar trabalho a todos".
O facto é que ao aceitarmos a eutanásia, introduzimos a ideia de que há vidas que já não valem a pena ser vividas. Afirmamos que não valorizamos o doente ao ponto de o pormos à frente de qualquer outro interesse. Valorizamos o homem produtivo, saudável, autossuficiente. Os outros, doentes incapacitados, dependentes nos cuidados diários, por mais que nos custe reconhecer são olhados de forma diferente. Não lhes atribuímos valor, não lhes reconhecemos dignidade de pessoa igual a mim como se de um outro eu se tratasse. Já não tem interesse para a sociedade, não é mais útil, dá trabalho, não está ali a fazer nada. Estas são as condições para morrer sem dignidade. E, quem tira a dignidade não é a doença, nem o sofrimento, é o próprio, os outros, a sociedade. Nada resta. Nada é. É só marcar o dia.
Mais tarde, quando formos confrontados com este tipo de sofrimento, será que vamos olhar para nós como olhamos para os outros? Será que vamos achar que já não valho nada e que o melhor é darem-me uma injeção e acabar com tudo? Querer morrer por não ter valor, por pensar que não tenho interesse para ninguém, que na situação de doença, sou um peso para os outros, não é isso o desespero total? Sei que o sentir-me assim valorizada irá provocar uma angústia nunca experienciada. Porque esta atitude é não atribuir dignidade e honra à pessoa que se foi e que ainda se é. Isto é eutanásia! Isto é o que se anda a discutir. Isto é o que se pretende legislar.
Assim, quando falamos de temas fraturantes como a eutanásia, não estamos a dizer que são fraturantes por dividirem a sociedade. Não é a sociedade que dividem. O que dividem é o próprio Homem, partem o conceito de Homem em dois opostos, olham para o Homem de duas formas: o Homem seguro, ilimitado, com direito a tudo e capacidade para reclamar tudo a que tem direito. E outro Homem fragilizado, com doença, que tem limites, incapacidades, inseguranças, que ainda está aqui, mas que já não interessa. Está no fim.
É bom que pensemos no conceito de Homem que queremos, porque o mais certo na vida e o mais fácil é passarmos de Homem forte e seguro para Homem frágil e exposto aos outros. Passar a ser olhado no fim de vida, com pena e não com amor. Não nos deixemos levar em enganos. O que querem resolver são os encargos com uma população que está a envelhecer, em que os filhos necessitam de faltar ao trabalho para acompanhar o pai doente, que necessita de ter condições, ou seja, de cuidados paliativos. Isso é o que necessitamos. Garantir cuidados paliativos, de alívio da dor e acompanhamento. Isso é estar preocupado com os problemas das pessoas. Só depois de garantir os cuidados que os doentes necessitam é que teremos espaço para estas discussões ou decisões. Não nos deixemos levar em enganos.

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