Caro Pedro Passos Coelho,

André Abrantes Amaral, Económico, 2016.03.02

Dirijo-me a si desta forma porque não tenho outro meio. E faço-o porque li algures que tenciona recuperar a social-democracia. Bem sei que o faz para se descolar da imagem racional e austera que lhe foi colada no última legislatura. Ora, o que lhe quero dizer é que faz mal. A social-democracia foi útil quando todos eram marxistas e era preciso tornar laranja o que para tantos era vermelho. Um bom instrumento quando, nos anos 70, o regime precisava que a direita não fosse ostracizada.
Acha sinceramente que Sá Carneiro, que lutou contra o sistema instituído, seria hoje social-democrata? Que diria, perante a bancarrota do Estado e a carga fiscal em máximos históricos, que o crescimento económico depende da despesa pública? Que encararia o sector privado como uma mera fonte de receitas? Crê que o programa da ‘troika’, que o senhor aplicou, resolveu os problemas profundos e estruturais da economia portuguesa? Acredita que, com um défice das contas públicas de 3% do PIB, os governos já podem voltar a gastar?
Acredito que não. Acredito que o senhor saiba que assim não pode ser. Então porque insiste? Porquê insistir naquilo que sabe que não funciona? Persistir no que sabe que vai empobrecer o país e sacrificar as novas gerações. Sejamos francos um com o outro: não há dinheiro. O senhor sabe disso melhor do que eu. Melhor do que qualquer um de nós. Então, repito: sejamos francos. Não havendo dinheiro para que o país se desenvolva, para que a economia cresça, para que os portugueses vivam melhor, não podemos continuar com essa experiência já testada à exaustão, conhecida como socialismo democrático ou social-democracia, conforme prefira chamar-lhe.
O regime saído do 25 de Abril chegou ao fim da linha. Ou vai para um novo resgate, sai do euro, desvaloriza a moeda, empobrece o país e repete-se tudo de novo como se nada se tivesse passado, ou temos um governo que enfrenta os interesses das corporações que dominam o Estado, redefine as suas funções centrando-as na saúde mas deixando o Estado de ser dono de escolas – é apenas um exemplo -, reduz a despesa e foca-se no pagamento da dívida que consome grande parte do orçamento.
Este governo pode ser o seu. Mas para que isso suceda é necessário que diga a verdade. É indispensável que não se iluda. Nós precisamos de alguém que diga o que todos vêem, mas ninguém ousa referir. Não tenha medo. Há centenas de milhares de portugueses que não têm, mas que não conhecem um político com quem possam contar. E deixe-me que lhe relembre isto: aqueles que avisaram para as dificuldades não falharam. Tão-só porque estas estão à vista. O tempo dar-lhe-á razão. Eu voto de bom grado naquele que defender medidas duras para problemas complexos e de difícil resolução. Acredite nisto: não sou o único.

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