O mundo ao contrário

Viriato Soromenho Marques | DN 2015.10.13

Um distraído observador estrangeiro que ignorasse o resultado das eleições de 4 de outubro ficaria convencido de que o PR tinha indigitado António Costa (AC) para formar governo. Depois de ter dito, ainda no calor dos resultados, que não iria contribuir para uma "maioria negativa" feita com os fragmentos de uma esquerda dividida por hostilidades antigas, AC lançou-se numa corrida, distribuindo-se por reuniões classificadas de modo encomiástico com o PCP, o BE e o PAN, em contraste com o vazio mutuamente defensivo da reunião com a coligação. Na política não existe a propriedade comutativa da adição. A ordem dos fatores importa e não é indiferente a sua sequência. AC deveria ter esperado que fossem os líderes da coligação a tomar a iniciativa de formar governo, que lhes pertence pelo resultado eleitoral, e pela escolha do PR. Deveria bater-se pelas suas quatro linhas vermelhas, condicionando o eventual futuro governo minoritário da direita a respeitar junto das instituições europeias e dos credores a exigência de um papel mais interveniente de Portugal na reconstrução de uma Europa capaz de sair da armadilha da austeridade. Para isso, AC tem um claro mandato eleitoral. Pelo contrário, ao concentrar em si a iniciativa, e ao falar com todos ao mesmo tempo, AC corre o risco de tropeçar na sombra da sua hiperatividade. Desobriga a coligação de esclarecer as razões da sua estranha passividade, quando urge encontrar uma solução de governo, correndo, ainda, o risco de ser visto como o único caso da III República de um secretário-geral que em vez de se tornar primeiro-ministro depois de ganhar as eleições quer ser primeiro-ministro para se manter como secretário-geral, mesmo depois de as ter perdido.

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